Saiba por que algumas emoções se tornam tóxicas e podem afetar sua saúde - e siga um programa detox para se livrar delas
O psicólogo sul-africano Peter Frost fazia parte da equipe gestora da Universidade de British Columbia, no Canadá, quando, em 1997, descobriu um melanoma, um tipo de câncer altamente agressivo. Depois do diagnóstico, fez uma reflexão e chegou à conclusão de que os anos no núcleo de comando da instituição foram prejudiciais para sua saúde. Frost acreditava que o turbilhão de sentimentos e o stress a que estava submetido tinham abalado seu sistema imunológico e, por isso, ele teria desenvolvido a doença. Com base nessa teoria, escreveu Emoções Tóxicas no Trabalho (Futura), livro em que aborda a importância de as empresas considerarem o lado emocional dos funcionários. A obra virou um best-seller, e Frost levantou - não apenas no mundo corporativo - a discussão sobre até que ponto raiva, medo e companhia podem afetar a mente e o corpo. Mas o psicólogo não venceu o câncer. Faleceu, em decorrência da doença, em 2004.
Muitos oncologistas discordam da teoria de Frost para o surgimento de seu melanoma. Nem a ciência provou a relação entre o stress emocional e o aparecimento de um câncer. Mas já se sabe que, sim, emoções tóxicas afetam diretamente a saúde. Claro que sentir raiva, tristeza ou inveja é inevitável. O problema é quando essas emoções se tornam crônicas. Aí elas podem ser tão prejudiciais que os psicólogos alemães Michael Linden e Andreas Maercker defendem em Embitterment (algo como amargurando, em português), livro não publicado no Brasil, a criação de um novo diagnóstico para facilitar o tratamento de pessoas que arrastam (e ruminam) sentimentos negativos pela vida: o do mal da amargura pós-traumática.
"Quando sentidas com muita intensidade ou por um período longo, emoções negativas fazem com que o corpo fique estressado. Então, a produção de cortisol aumenta e, em excesso no organismo, esse hormônio debilita o sistema de defesa, nos deixando mais propensos a alergias, vírus e bactérias", diz o médico Ricardo Monezi, pesquisador do Instituto de Medicina Comportamental da Universidade Federal de São Paulo. Portanto, para entender melhor o efeito da contaminação pelas chamadas emoções tóxicas, é necessário compreender o que é o stress. Equivale ao modo de alerta do organismo. Diante da sensação de perigo, ele se prepara para a fuga ou a briga. No entanto, quando se fica permanentemente nesse estado, o feitiço vira contra o feiticeiro. "O que teria a função de nos proteger acaba nos agredindo. Por exemplo, o sangue corre mais rápido e, em última instância, isso pode levar a um ataque do coração", explica Dean Ornish, presidente do Instituto de Pesquisa em Medicina Preventiva, na Califórnia, nos Estados Unidos.
As emoções tóxicas vivenciadas sem tréguas também podem provocar alterações de comportamento e até distúrbios psiquiátricos, como o transtorno obsessivo compulsivo (TOC). "Sob o efeito da raiva ou tristeza, ficamos inebriados, nosso discernimento diminui, avaliamos mal as situações e tomamos decisões e atitudes equivocadas", exemplifica a psicóloga Ana Maria Rossi, presidente da International Stress Management Association no Brasil.
O universo dos sentimentos ruins é amplo. Vai da fraqueza, que nos faz sentir vítimas, à raiva, que gera ressentimento. A vergonha, a culpa, a tristeza, a solidão, o ciúme e a inveja também estão na lista. E eles surgem em diversos momentos da vida: quando morre um ente querido ou acaba um relacionamento, após uma briga familiar, em uma discussão com um amigo e até se aquela almejada promoção é dada ao colega. Em excesso, até emoções positivas, como a paixão, podem ser tóxicas e desencadear o mesmo processo nocivo. O limite entre o que é ou não saudável depende de cada um. "O sofrimento não está no fato em si, mas na percepção que se tem dele", resume Márcia De Luca, especialista em ioga e ayurveda (a medicina indiana). É preciso saber lidar de modo equilibrado com as adversidades e, se sentimentos negativos surgem, ter estratégias para se livrar logo deles.
Detox emocional: seu plano de ação
Fique de olho nos sinais
O corpo mostra quando a mente não vai bem. A pele, o cabelo e o olhar perdem o brilho. A pressão sanguínea fica alterada. "Bruxismo, alterações do sono e do apetite, pessimismo constante, perda da autoconfiança e da capacidade são sinais clássicos da presença de emoções tóxicas", enumera a psicóloga Ana Maria Rossi.
Identifique os males
Reflita para identificar qual emoção tóxica está sentindo e por quê. Raiva? E o que a levou a ficar irada com determinada pessoa? Escreva: por as ideias no papel contribui para clarear a mente. "Se não chegar sozinha a conclusões, peça ajuda a uma pessoa que você ama e a ama também e que será sincera", sugere o médico Ricardo Monezi, da Unifesp.
Desafie os pensamentos
Identificado o sentimento ruim e o que o causou, avalie se sua reação foi ou não exacerbada. Fique atenta às pressões externas que inflam suas emoções. "As pessoas podem se sentir incapazes por não atingir metas de vendas e esquecer que as empresas estipulam objetivos impossíveis para elas darem o máximo de si", exemplifica Ana Maria.
Fale e desabafe
Se depois da reflexão você considerar que sua reação não foi desmedida, não guarde as emoções negativas. Converse com pessoas próximas para pôr para fora e, se achar que ficará aliviada, também com quem você se desentendeu ou a magoou de alguma maneira. "Nas relações tóxicas, há campos de segredos e mágoas não ditas", ressalta a psicanalista Dorli Kamkhagi, do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas de São Paulo.
Rompa ou aceite
"Não existe emoção eterna, que não possa ser mudada", ressalta o médico Ricardo Monezi. Mas é preciso agir. Se uma relação não lhe faz bem, ponha fim a ela. Isso vale para amores e amizades. "Encerrar traz força. Não precisamos carregar as pessoas por toda a vida", alerta Dorli. Se você não tiver controle algum sobre a situação que a incomoda, apenas tente aceitá-la.
Faça a Pollyanna
Procure ver o lado positivo do evento que foi nocivo para você. É o que os especialistas chamam de ressignificação das emoções. Uma boa ideia é tirar uma lição do ocorrido. "Quanto mais pensamos em coisas boas, maior é a chance de nos recuperarmos das emoções negativas", avisa Monezi. "Esse é um processo que exige muita disciplina."
Cuide de você sempre
Doses altas de álcool, café e açúcar podem aumentar a ansiedade. Pegue leve e introduza momentos de relaxamento em sua rotina. "Passe as horas de lazer com pessoas queridas", sugere o médico Dean Ornish, da Califórnia. A regra é: faça o que puder por si mesma. A ansiedade no trabalho anda alta? Permita-se chegar mais tarde às vezes ou faça pausas demoradas para o café.
Mexa o corpo e alivie a mente
Estudos mostram que a prática de ioga diminui o nível de stress no corpo. Mas qualquer exercício é benéfico, de caminhar a correr e dançar. Já a meditação faz com que pensamentos arraigados se dissipem.
Aprenda a diferenciar
Emoções negativas podem não se tornar tóxicas. Já se disse que sentir raiva, inveja ou tristeza faz parte da vida. Mais: as dores são importantes para o amadurecimento. Só não deixe que elas tomem conta de sua vida e a corroam por dentro. Aí a fronteira será ultrapassada.
(texto publicado na revista Claudia nº 51 - ano 7 - julho de 2012)
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