"Paciência e carinho não bastam"
Quando Silvia, a rainha da Suécia, entra em algum lugar, invariavelmente as pessoas se levantam. É o que reza o protocolo - mas nenhum sueco faz isso a contragosto. Silvia Renate Sommerlath casou-se com o rei Carl Gustav em 1976, quatro anos depois de conhecê-lo quando trabalhava no cerimonial da Olimpíada de Munique. Nascida em 1943 na Alemanha, filha de um nativo e de uma brasileira, ela morou em São Paulo dos 4 aos 14 anos (aliás, Sua Majestade fala um português irretocável).
Ao assumir o trono, seu modo simpático, despojado e caloroso de ser logo derreteu a famigerada frieza escandinava. A entrevista a seguir foi realizada no Silviahemmet, ou Lar da Silvia, fundado há dezoito anos pela rainha e voltado ao tratamento de idosos com demência, problema enfrentado por sua mãe. Além de receber os pacientes, que passam o dia na instituição - localizada em Drottningholm, perto do palácio real, em Estocolmo -, o Silviahemmet forma profissionais para cuidar especialmente de quem sofre de males que afetam a memória, como o Alzheimer, por exemplo.
A mãe da senhora sofreu com demência. Esse foi o ponto de partida para a criação do Silviahemmet?
Sim. Quando mamãe adoeceu, meu pai tomou a iniciativa de cuidar dela. Eles moravam na Alemanha, longe de mim e de meus irmãos. Então, não notamos que ela estava doente. Só quando papai morreu percebemos que ela não tinha capacidade de se organizar sozinha. Percebi também que os remédios eram muito fortes. Ela não conseguia levantar-se cedo nem andar direito. Na época, os médicos não sabiam muito sobre o assunto. Achavam que toda pessoa de idade era esquecida. Lembro-me de ter perguntado ao médico dela o que eu poderia fazer. A resposta foi que o melhor remédio era a informação. Fiz esse centro pensando nisso. Temos cursos para formar enfermeiras e cuidadores, mas instruímos até motoristas de táxi sobre como lidar com os idosos. No caso das enfermeiras, o curso dura dois anos e quem participa recebe um diploma.
Tendo vivido essa situação dentro da própria família, o que a senhora considera mais difícil de enfrentar em relação à demência?
É muito difícil para os familiares. É um trabalho pesado. Não é só ter paciência dar carinho e amor. Tem de ter energia. A ideia do Silviahemmet é também dar um alívio aos familiares. Os idosos passam o dia aqui uma, duas ou até cinco vezes por semana. Fizemos um livro infantil para explicar às crianças por que a vovó ou o vovô não se lembram das coisas ou têm a aparência séria. Muitas vezes o idoso perdeu a capacidade de controlar os músculos e por isso fica com a expressão sisuda.
A instituição também oferece informações práticas em relação a organizar uma casa para pessoas com demência. O que pode ajudá-las?
Uma vez, minha mãe estava no quarto, passando por um tapete e indo em direção a outro. De repente, entrou em pânico, e eu não sabia o que era. Quando contei ao médico, ele me perguntou a cor do tapete. Era de um azul esverdeado. Aprendi que, para pessoas com demência, as cores escuras são como um abismo. O médico me orientou a substituir os tapetes da casa por outros de cores vivas, como laranja ou vermelho. Nunca mais o problema se repetiu.
A senhora se envolve pessoalmente com os pacientes?
Confesso que, no início, eu vinha mais ao centro. Pegava a bicicleta e pedalava até aqui. Hoje, não consigo mais vir tanto quanto gostaria.
Continua visitando o Brasil?
Todos os anos. Ficamos muito tristes com a notícia da morte de Eduardo Campos. Eu e meu marido o conhecemos através da Childhood (outra instituição da rainha, que, no Brasil, tem um braço em Pernambuco). Ele nos ajudou muito a constituir o centro, que trata de crianças que foram abusadas sexualmente.
A mãe da senhora sofreu com demência. Esse foi o ponto de partida para a criação do Silviahemmet?
Sim. Quando mamãe adoeceu, meu pai tomou a iniciativa de cuidar dela. Eles moravam na Alemanha, longe de mim e de meus irmãos. Então, não notamos que ela estava doente. Só quando papai morreu percebemos que ela não tinha capacidade de se organizar sozinha. Percebi também que os remédios eram muito fortes. Ela não conseguia levantar-se cedo nem andar direito. Na época, os médicos não sabiam muito sobre o assunto. Achavam que toda pessoa de idade era esquecida. Lembro-me de ter perguntado ao médico dela o que eu poderia fazer. A resposta foi que o melhor remédio era a informação. Fiz esse centro pensando nisso. Temos cursos para formar enfermeiras e cuidadores, mas instruímos até motoristas de táxi sobre como lidar com os idosos. No caso das enfermeiras, o curso dura dois anos e quem participa recebe um diploma.
Tendo vivido essa situação dentro da própria família, o que a senhora considera mais difícil de enfrentar em relação à demência?
É muito difícil para os familiares. É um trabalho pesado. Não é só ter paciência dar carinho e amor. Tem de ter energia. A ideia do Silviahemmet é também dar um alívio aos familiares. Os idosos passam o dia aqui uma, duas ou até cinco vezes por semana. Fizemos um livro infantil para explicar às crianças por que a vovó ou o vovô não se lembram das coisas ou têm a aparência séria. Muitas vezes o idoso perdeu a capacidade de controlar os músculos e por isso fica com a expressão sisuda.
A instituição também oferece informações práticas em relação a organizar uma casa para pessoas com demência. O que pode ajudá-las?
Uma vez, minha mãe estava no quarto, passando por um tapete e indo em direção a outro. De repente, entrou em pânico, e eu não sabia o que era. Quando contei ao médico, ele me perguntou a cor do tapete. Era de um azul esverdeado. Aprendi que, para pessoas com demência, as cores escuras são como um abismo. O médico me orientou a substituir os tapetes da casa por outros de cores vivas, como laranja ou vermelho. Nunca mais o problema se repetiu.
A senhora se envolve pessoalmente com os pacientes?
Confesso que, no início, eu vinha mais ao centro. Pegava a bicicleta e pedalava até aqui. Hoje, não consigo mais vir tanto quanto gostaria.
Continua visitando o Brasil?
Todos os anos. Ficamos muito tristes com a notícia da morte de Eduardo Campos. Eu e meu marido o conhecemos através da Childhood (outra instituição da rainha, que, no Brasil, tem um braço em Pernambuco). Ele nos ajudou muito a constituir o centro, que trata de crianças que foram abusadas sexualmente.
(texto publicado na revista Veja edição 2391 - ano 47 - nº 38 - 17 de setembro de 2014)
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