A história de Cinderela, essa inocente vítima da opressão, tem sido, com pequenas variações, parte de toda e qualquer cultura. Ela pode ter surgido no passado distante entre os chineses, cujos aristocratas apreciavam pés pequenos. A versão popular hoje em dia foi transcrita da tradição oral nos anos 1600 por um francês, Charles Perrault, e transformada em filme por Walt Disney, em 1950.
A influência prejudicial de Cinderela lançou uma sombra sobre nós. Ela personaliza uma distorção da realidade, a realidade na qual se espera que nossas recompensas sejam merecidas.
Uma das características sinistras da história é a ideia de que as madrastas são más. Na verdade, não podemos nem pensar na palavra "madrasta" sem mentalmente acrescentar o adjetivo "má" a ela. Além disso, Cinderela reforça a mentalidade passiva daqueles que aceitam sua carga de opressão na vida enquanto esperam que forças místicas venham a seu auxílio.
No final, Cinderela se torna uma princesa e perdoa sua madrasta e as irmãs adotivas opressoras, apesar de sabermos que elas deveriam ser processadas por abuso infantil.
Cinderela é patética, mas nos apaixonamos pela ideia de que a tonta vencerá no final. Para esse fim, uma fada madrinha lhe dá roupas elegantes para que ela consiga atrair os olhares do príncipe que, por acaso, está justamente procurando uma mulher para se casar. Enfeitada com suas roupas espalhafatosas e jóias vistosas, Cinderela chama sua atenção em um baile onde não é nada além de um cabide de roupas. Ela não fez nada para merecer as atenções. Ela não merece nada, exceto, talvez, o salário mínimo em casa. E, mesmo assim, consegue fazer com o príncipe se case com ela. Não é essa a lição que deveríamos ensinar às nossas crianças. Há valores mais importantes do que boa aparência, roupas finas e enfeites caros - inteligência, independência, auto-estima, responsabilidade e automotivação - e nenhum deles caracteriza Cinderela.
Vamos deixar a mentalidade da Cinderela de lado e apresentar às crianças os valores genuínos na vida, isto é, que elas precisam merecer suas recompensas. E, enquanto fazemos isso, vamos nos livrar da atitude de que somos malvados se gritarmos para nossos filhos: "Arrume o seu quarto!".
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É uma velha história:
A fábula originou-se na China mais ou menos no ano 960, em The Miscellaneous Record of Yu Tang (O variado registro de Yu Tang), por Tuan Ch'eng-Shih.
(texto publicado no livro escrito por Dan Karlan, Jeremy Salter e Allan Lazar As pessoas mais importantes do mundo que nunca viveram com tradução de Cristina Yamagami)
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