sábado, 8 de fevereiro de 2014

Coisa demais para o cérebro resolver


Há alguns anos, o neurocientista Matthew Lieberman, na época um aluno de pós-graduação de Harvard, propôs o seguinte experimento: 32 pares de introvertidos e extrovertidos, todos desconhecidos uns dos outros, conversaram por alguns minutos ao telefone. Quando desligavam, pedia-se que preenchessem questionários detalhados, avaliando como haviam se sentido e se comportado durante o diálogo. “O quanto você gostou de seu parceiro?”, “O quanto você foi amigável?”, “O quanto você gostaria de interagir com essa pessoa novamente?”. Também foi pedido que os voluntários se colocassem “na pele” de seus parceiros de conversa: “O quanto você acha que ele gostou de você?”, “O quanto ele foi sensível a você?”, “Quão encorajador lhe pareceu?”.

Lieberman e seus colaboradores compararam as respostas, ouviram os diálogos e fizeram seus próprios julgamentos a respeito de quanto os participantes se sentiam um em relação ao outro. Eles descobriram que os extrovertidos eram muito mais precisos do que os introvertidos em perceber se seus parceiros haviam gostado de falar com eles. Essas descobertas sugerem que pessoas com esse traço são mais eficientes em decodificar pistas sociais do que os introvertidos. Em um primeiro momento, isso não pareceu surpreendente, já que prevalece a hipótese popular de que extrovertidos são melhores na leitura de situações sociais. Por meio de um desdobramento de sua experiência, porém, Lieberman mostrou que essa hipótese não está correta.

O neurocientista e sua equipe pediram a um grupo de pessoas que ouvissem as gravações das conversas que haviam acabado de ter – antes de preencher um questionário. Eles descobriram que nesse grupo não havia diferença entre introvertidos e extrovertidos em sua habilidade de ler pistas sociais. Por quê? A resposta é que os indivíduos que ouviram as gravações puderam decodificar pistas sociais sem ter de fazer mais nada ao mesmo tempo. Mais: introvertidos são decodificadores bastante bons, até melhores que os extrovertidos. Mas esses estudos mediam quão bem os mais retraídos observam dinâmicas sociais – e não quanto se envolvem nelas, já que isso impõe demandas ao cérebro muito diferentes das exigidas na observação. Participar requer uma espécie de cumprimento mental de várias tarefas ao mesmo tempo: a capacidade de processar muitas informações de curto prazo de uma só vez sem se distrair ou se estressar demais. Esse é o tipo de funcionamento neurológico no qual extrovertidos geralmente têm facilidade.

Considere que a mais simples interação social, mesmo entre duas pessoas, requer a realização de uma impressionante quantidade de tarefas: interpretar sua linguagem corporal e as expressões faciais; sutilmente se revezar entre falar e ouvir; responder ao que a outra pessoa disse; perceber se está sendo compreendido; determinar se é bem recebido e, se não, encontrar uma forma de melhorar a situação ou retirar-se dela. Pense no que é necessário para processar tudo isso de uma só vez! E isso numa conversa com uma só pessoa. Agora pense na quantidade de tarefas simultâneas que é necessária em uma configuração de grupo. Por isso, qundo introvertidos assumem o papel de observadores, escrevem romances ou se atêm a uma teoria, por exemplo, não estão demonstrando falta de vontade ou de energia – simplesmente estão fazendo o que sua constituição manda.



(texto publicado na revista Mente Cérebro nº 233)




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