sábado, 1 de outubro de 2016

Acupuntura e fitoterapia - Wu Tou Kwang


A Medicina Tradicional Chinesa (MTC) é bastante ampla e se utiliza da fitoterapia, massoterapia, dietética, ginástica e acupuntura para tratar as mais diversas enfermidades. Como no Ocidente a acupuntura chegou antes e chamou muita atenção por ter sua terapêutica baseada em agulhas, acabou se destacando e passou a ser erradamente vista como o único elemento da MTC.

A filosofia chinesa tem suas raízes nos princípios do yin e yang e dos cinco elementos. Como todas as atividades do Oriente baseiam-se nesses conceitos, incluindo a astrologia, a arquitetura, a decoração, a administração, o comércio e a política, a acupuntura e fitoterapia, ramificações da MTC, não podiam ser diferentes. Ao classificar as plantas medicinais como frias, frescas, mornas e quentes, os chineses consideraram seus aspectos yin e yang; e, ao dividi-las em azedas, amargas, adocicadas, picantes e salgadas, aplicaram os cinco elementos.

Por absoluta ignorância, a classe médica ocidental rejeitou a acupuntura por dezenas de anos. Na verdade, foi só a partir de 1972, quando os efeitos da acupuntura na anestesia foram praticamente comprovados, que a comunidade científica mundial reconheceu os méritos da técnica. Na China, a acupuntura e a fitoterapia são praticadas em grande escala por médicos com formação tradicional, enquanto a medicina química do Ocidente é considerada... uma terapia alternativa.

A civilização chinesa

Para compreender a importância e validade da MTC, é importante conhecer a grandeza das contribuições das China para o progresso humano. A civilização chinesa é uma das mais antigas do mundo. Entre todas, é a única a sobreviver continuamente no tempo, mantendo sua cultura e tradição praticamente intactas. O idioma é o mais antigo ainda em uso no planeta, é o mais empregado no mundo e guarda as características de transição entre o desenho e a escrita moderna.

A civilização chinesa espalhou suas influências por todo o planeta, e muitas delas perduram até os dias de hoje. Arroz, soja, laranja, lichia, kiwi, chá, kung fu, tai chi chuan, qi gong, cama-de-gato, tangram, origami, xadrez chinês, dominó, balões, hibisco e crisântemo tiveram sua origem na China e se tornaram partes da vida moderna nos quatro cantos do mundo. Isso sem contar a culinária, que aliás nada tem a ver com os fastfoods ou as pastelarias! Quem já não ouviu falar ou experimentou biscoitos da sorte, chop suey, rolinho de primavera, frango xadrez, porco agridoce, maçã caramelada, barbatana de tubarão e ninho de andorinha? Os chineses costumam dizer: "Tudo que tem quatro pés, não sendo mesa, pode ser comido".

O restaurante, como local para se ir comer por prazer e ter um convívio social, foi criação dos chineses em 1120 d.C. O mais antigo tratado de estratégia do mundo, A Arte da Guerra, foi um legado de Sun Tsu há 2500 anos. Tal obra continua moderna, sendo consultada inclusive nas guerras comerciais e esportivas do século XX - seus princípios foram aplicados no futebol pelo técnico Carlos Alberto Silva. O livro I Ching é considerado uma das obras mais importantes da humanidade. A radiestesia era praticada na China há 4200 anos - existe uma xilogravura milenar mostrando o imperador Kwang Yu com uma forquilha radiestésica; ele foi célebre pela capacidade de descobrir jazidas minerais, lençóis de água, objetos escondidos e para determinar os trabalhos da terra de acordo com as diferentes estações.

Querem mais? Os chineses foram os pais da aeronáutica, inventaram a pipa, a pólvora, os fogos de artifício e soltaram os primeiros foguetes sinalizadores. 

A expansão da acupuntura

A acupuntura é, sem a menor dúvida, uma das formas de tratamento mais antigas do nosso planeta. Os maias já conheciam a circulação de energia nos meridianos do corpo físico e descreviam inclusive alguns canais energéticos do corpo etérico. Os índios brasileiros intuitivamente aprenderam a estimular regiões do corpo com instrumentos pontiagudos, como espinhos de plantas e ossos de animais, mas foram os chineses que sistematizaram, preservaram e divulgaram essa técnica até o século XX, graças à invenção do papel e da imprensa.

No século VI, a acupuntura chegou à Coréia e ao Japão. No século XVII, alcançou a Europa através da Rota da Seda, mas era vista como curiosidade, representando um método bárbaro praticado por povos estranhos.

No ano de 1900, Soulié de Morant, diplomata francês situado em Pequim, conheceu a acupuntura durante uma epidemia de cólera na região. Certo empregado da embaixada estava doente e um médico chinês foi convocado para aplicar acupuntura nele. Vendo a eficácia do tratamento, Morant passou a estudá-lo durante os 30 anos seguintes em vários hospitais da China, Japão e Coréia, e chegou a escrever para seu governo sobre as vantagens de implantar a acupuntura na França.

Ao retornar a seu país em 1930, o diplomata resolveu demonstrar a terapia das agulhas para seus amigos e médicos. Ele foi tão ridicularizado e marginalizado que chegou a pensar em esquecer que um dia havia conhecido aquilo. No entanto, um dos médicos o encorajou a escrever sobre suas experiências e Morant acabou lançando o livro Compêndio da Verdadeira Medicina Chinesa. Mas o destino não foi generoso com o diplomata, após alguns anos, o médico Roger de La Fuye decidiu fundar uma associação e o excluiu pelo simples fato de Morant não ser formado em medicina. 

A acupuntura teve grande divulgação em 1972 com a visita do então presidente Richard Nixon à China. Um dos jornalistas de sua comitiva foi operado de apendicite aguda num hospital de Pequim e no pós-operatório apresentou dores e distensão abdominal. Veio um médico chinês e eliminou os sintomas prontamente fazendo uso da acupuntura. Durante a convalescença, o jornalista descobriu que a técnica era utilizada para anestesias naquele hospital. A notícia percorreu o mundo e muitos neurofisiologistas passaram a pesquisar o assunto com seriedade, chegando a desvendar parte dos mecanismos da acupuntura.

Nos EUA, os responsáveis pela introdução da terapia ao povo foram os imigrantes chineses. Um americano havia aprendido acupuntura em Hong Kong e passou a aplicá-la em Nova York, sendo perseguido pela comunidade médica, o que deu origem a um processo judicial. Hoje, a acupuntura é aceita em todos os 53 estados americanos, e em 37 deles pode ser praticada por profissionais sem formação em medicina ocidental. No momento, existem 40 faculdades de medicina oriental nos EUA, e os remédios chineses passaram a constituir um sério concorrente para a indústria farmacêutica.

No Brasil, a acupuntura foi introduzida pelos imigrantes orientais há 100 anos, e o precursor ocidental foi o professor Friedrich Spaeth, que praticava a terapia no eixo São Paulo-Rio.

O que, afinal é acupuntura?

A medicina tradicional chinesa indica dietas, tai chi chuan, qi gong, meditação, orações, quiroprática, farmacoterapia, acupuntura e até cirurgia no tratamento das enfermidades. Os chineses consideram as doenças como bloqueios da circulação de qi (energia), o que gera desequilíbrios energéticos entre meridianos e órgãos, provocados por distúrbios alimentares, emocionais ou climáticos. Neste contexto, a acupuntura visa normalizar a circulação de energia através de estímulos físicos e químicos em determinados pontos do corpo, novamente fazendo uso do conceito yin/yang e dos cinco elementos.

Hoje, alguns médicos acupunturistas ocidentais, fascinados pela alta tecnologia, renegam a tradição dizendo que a acupuntura atua no sistema nervoso central como simples inibição competitiva da dor, ou apenas como estímulo para a produção de endorfinas. Isto é ignorar a verdadeira acupuntura, que vem sendo praticada há 3 mil anos, e optar pela medicina ocidental moderna, que conta com meros cem anos de existência.

A palavra acupuntura significa furar com agulha (acu: agulha; puntura: furar) e causa a impressão de que o terapeuta só trabalha com agulhas. Isto não é verdade. Os pontos e meridianos podem ser estimulados por dedos, agulhas,  calor, eletricidade, magnetismo, cores, música, ultra-som, laser, injeção, fio cirúrgico, ativadores de acetilcolinesterase (cloreto de Césio, cloreto de Lítio, ureia, carbonato de Lítio, etc.), martelo de 7 pontas, esparadrapo, escova de dentes, carretilhas, espátulas, lixas, passes, movimentos, respiração e qi gong. Com isso, podemos concluir que acupuntura não é apenas furar com agulha.

Pontos e meridianos

Nosso corpo possui canais superficiais e canais profundos, com trajetos longitudinais transversais ou diagonais, por onde circula o qi. Os canais interligam todas as regiões, estruturas e órgãos do corpo. Alguns, com trajetos superficiais, foram chamados de meridianos e neles localizam-se pequenas áreas denominadas pontos. Existem 361 pontos nos doze meridianos principais e nos dois meridianos da linha mediana. Nas últimas décadas, descobriram-se novos meridianos e pontos, e foram localizados os microssistemas, que contêm pontos representando todo o corpo nas regiões da orelha, nariz, face, língua, couro cabeludo, mãos, pés, abdome, dorso, íris e dentes.

A auriculoterapia (microssistema dos pontos da orelha) foi descoberta em 1953 por Paul Nogier. A craneopuntura (microssistema dos pontos do couro cabeludo) foi descoberta pelo neurocirurgião Chiao Sun Fa, em 1971. O médico alemão Reinhold Voll descobriu, na década de 50, uns 500 pontos e os chamados oito meridianos degenerativos, além da relação dos pontos de acupuntura com órgãos, funções e tecidos.

Nos últimos 50 anos, pesquisas revelaram que os pontos de acupuntura apresentam maior concentração de terminações nervosas, densidade aumentada de neurotransmissores e reduzida impedância elétrica. Hoje, todos os pontos e meridianos descritos no livro Nei Jing apresentam comprovações anatomofisiológicas, eletrônicas, fotográficas, radioisotópicas e são detectados pela ressonância nuclear magnética.

A acupuntura não está isolada da medicina ocidental moderna e nem das terapias alternativas. Todos os pontos descobertos pelas outras disciplinas já eram conhecidos pelos chineses há milhares de anos. Os chakras dos indianos, os pontos motores da fisioterapia, os pontos de Weihe dos homeopatas e os pontos eletropermeáveis de Nakatani são todos pontos de acupuntura. Os pontos, meri-dianos e princípios da medicina oriental são usados pela cinesiologia aplicada e pela biocibernética bucal. Há inclusive relações entre a iridodia-gnóstico e a acupuntura.

As teorias

A acupuntura pode ser explicada de várias formas. A explicação mais antiga e provavelmente a mais completa está na Teoria Energética. A energia circula no corpo por todos os meridianos, órgãos, vísceras e tecidos. Quando a energia circula fluentemente e a proporção entre os componentes yin e yang está equilibrada, o ser vivo tem saúde. Havendo obstáculos na livre circulação da energia ou desequilíbrio entre yin e yang, o ser vivo não tem saúde, embora não necessariamente esteja doente na concepção da medicina química ocidental.

O estímulo dos pontos e meridianos visa restabelecer o equilíbrio energético e a saúde. Como os desequilíbrios precedem as doenças, a acupuntura é uma medicina não apenas curativa, mas também preventiva.

Com base nas comprovações científicas de que existe a liberação de endorfinas no líquido cefalorraquidiano e em outras estruturas nervosas, obtidas por estímulo prolongado dos pontos de acupuntura, e que as endorfinas são substâncias semelhantes à morfina, mas com efeito analgésico cem vezes mais potente, talvez esteja aí a explicação para os fenômenos analgésicos e psíquicos da técnica.

Indicações

A acupuntura ganhou reconhecimento popular como um excelente tratamento para as dores. Agindo como equilibradora das energias circulantes, ela serve para prevenir e tratar qualquer doença dos seres vivos, vegetais ou animais. Nos humanos, funciona desde os recém-nascidos até os bem idosos.

Suas indicações mais frequentes são no tratamento das síndromes provenientes de lombociatalgias, cervicobranquialgias, bursite de ombro, tenosinovites, LER, enxaquecas e sinusites, mas deve-se ressaltar que a acupuntura não é indicada apenas para tratar fenômenos dolorosos. A técnica também é eficaz na bronquite asmática, rinite alérgica, sinusite, paralisia facial, vertigens e zumbidos, impotência sexual, alterações do ciclo menstrual, distonia neurovegetativa, ansiedade, herpes, adenoma de próstata, estrabismo adquirido, fraqueza dos membros inferiores, dores de pé persistentes após revascularizações, neuropatia diabética, sequelas de derrame cerebral, sequelas de paralisia cerebral, calvície, obesidade, tabagismo, toxicomania, estética facial ou corporal, cicatrizes, etc.

Na pediatria, pode tratar resfriados frequentes, asma brônquica, diarreias crônicas e até choros noturnos - tudo isso utilizando apenas escova de dentes, palitos de fósforo ou de dentes, moeda, espátula e cigarro. A única queixa das mães é que a escovação da pele pode causar cócegas e os bebês ficam brincando, o que dificulta a sessão.

Quanto aos vícios, tabagismo, obesidade, toxicomania e alcoolismo, devemos lembrar que a acupuntura não foi inventada para isso. Na Antiguidade, tais problemas não existiam. Esses males são fruto da sociedade moderna, e entram em jogo muito dinheiro e propaganda. O combate aos vícios não é fácil, mas a acupuntura realmente pode auxiliar diminuindo a ansiedade, reduzindo a vontade de comer, fumar ou beber, alterando o paladar, provocando mal-estar quando a pessoa fuma ou bebe, dando sensação de bem-estar físico e mental. De qualquer maneira, a terapia não é milagrosa e precisa do desejo e vontade do paciente, bem como da cooperação dos familiares e amigos.

Apesar de todas as vantagens, por falta de esclarecimento e pelo medo, até hoje muitos vêem a acupuntura como um tratamento doloroso, onde o paciente é sadicamente torturado por agulhas, o que quase sempre torna a acupuntura uma das últimas opções terapêuticas. O paciente recorre ao acupunturista em caso de desespero total, após esgotar toda a ciranda dos tratamentos disponíveis. Geralmente já passaram pela medicina química ocidental, fisioterapia, cirurgia, fitoterapia, simpatias, homeopatia, curas espirituais, etc. Com isso, os acupunturistas praticamente só recebem "abacaxis e pepinos", e apesar dos pesares têm obtido excelentes resultados!

A acupuntura pode tratar desde simples distúrbios energéticos até as chamadas doenças orgânicas. A técnica tem múltiplas indicações e pode ser associada a qualquer outra forma de terapia. Digo mais: todas as pessoas devem conhecer meridianos e pontos, e aprender a se equilibrar através de estimulações digitais ou instrumentais. Com isso, fica mais fácil manter a saúde, prevenindo e tratando as doenças em suas fases iniciais.

Sem dúvida, a milenar acupuntura estará ocupando um papel cada vez mais preponderante no Terceiro Milênio, quando a saúde e a qualidade de vida estarão ocupando um espaço cada vez maior nas prioridades do ser humano.




(texto publicado na revista Fitoterapia & Saúde nº 1 - ano 1)

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