segunda-feira, 14 de novembro de 2016

Volte a ser criança - Wayne Dyer


As pessoas me dizem sempre: "Você não cresce nunca! Continua o mesmo menininho? Por que é que você não age de acordo com a sua idade?"

Enquanto me disserem que sou infantil, tudo bem. Gosto de ser criança. Para mim, as crianças são como água fresquinha de moringa. Mais ainda, as pessoas que tenho ajudado a tornarem-se mais acriançadas parecem sentir-se melhor com elas mesmas e com suas vidas.

Você é capaz de estar comentando para os seus botões: "Claro que eu também gostaria de ser criança outra vez, sem nada para me preocupar, mas tenho responsabilidades familiares, preocupações financeiras e outros problemas a considerar. Como é que a gente pode voltar a ser criança e continuar um adulto responsável?"

Um retorno voluntário à infância significa que você tenha de desistir de ser adulto. Significa só que deve relaxar um pouco, tirar sua máscara de adulto, recordar a forma espontânea como você costumava apreciar o mundo, tudo e todos, com aquele olhar maravilhado.

Segundo certa mitologia que conheço bem, existe, algures na Terra, uma fonte mágica cujas águas têm a propriedade de restaurar a juventude perdida. Eis cinco caminhos que vão dar a essa fonte:

Riso. A criança que existe dentro de você adora rir. Às vezes os pequenos riem "por nada", por pura alegria. Se você estiver rindo pouco, tente levar-se menos a sério. Recorde experiências da sua infância que na altura lhe pareceram tristes mas que agora merecem uma boa risada... e excomungue-as rindo.

Quando voltar a acontecer qualquer coisa que o ponha mal-humorado, pergunte a si mesmo. "Será que vou poder rir disto mais tarde?" Se assim for, por que não rir agora mesmo? Um amigo contou-me esta história: "Quando eu andava na escola pública, fui suspenso por uns dias por ter feito uma guerra de ervilhas no refeitório. Eu tinha queimado as pestanas para ganhar uma bolsa de estudos num colégio particular; por isso, fui para casa completamente destroçado. 'Bom", pensei, 'acabou-se. Nunca me darão a bolsa.' Aí, uma vozinha falou dentro de mim: 'Você só tem 13 anos, e pensa que levar uma suspensão é o fim do mundo? Ainda por cima por tão pouco? Nesse momento, parei de chorar por dentro e comecei a rir."

Fantasia. As crianças adoram sonhar, usar a imaginação - e o mesmo aconteceria consigo se você deixasse. Lembra-se de como, quando você era novo, sozinho em seu quarto à noite, um galho se transformava numa varinha de condão, e um pau de vassoura num cavalo? Aquele mundo da infância, rico em fantasia, não era apenas divertido, era também um dos aspectos mais saudáveis da sua vida. Provavelmente, quanto mais você se entregou a ele e quanto mais essas tendências foram encorajadas, tanto mais criativo você é hoje.

Como adultos, nós podemos permitir-nos o luxo de fantasiar com a mesma alegria e benefícios para nossa saúde mental. Faça uma lista de 20 coisas que há muito sonha fazer - seja participar numa maratona, aparecer na televisão ou visitar a Bulgária. Agora, risque as fantasias cuja realização imediata parece impossível. Deve ficar pelo menos um sonho que você possa realizar hoje mesmo. Faça-o, depois comece a planejar o segundo mais viável da lista. Gradualmente, você irá transformando em realidade muitas das suas fantasias "infantis" e a maioria acabará por constituir proezas bem sólidas.

Espontaneidade. A criança que existe em você morre por ser impulsiva e aventureira. A espontaneidade é, porém, uma das coisas que os adultos mais facilmente reprimem neles próprios... e em seus filhos, incutindo-lhes o medo do desconhecido e retirando-lhes sua natural curiosidade pelo viver.

Se você tiver uma vida completamente planificada, com todos os objetivos predeterminados, se estiver obcecado pela organização e ordem em tudo o que faz, você já esqueceu o que é ser criança.

Na próxima vez que um amigo sugerir qualquer coisa em cima da hora, e você começar a dizer "Ah, não posso", pare. Pergunte a você mesmo se vale a pena continuar a dizer sempre "Não posso". Dê ouvidos a essa criança há tanto tempo extraviada dentro de você.

Aceitação. Quando o bebê entra no mundo, não pode saber se tudo aquilo podia ou devia ser diferente do que é. Ao crescer, a criança vai aprendendo a controlar certas coisas: a beber por um copo, usar talheres, fazer amigos - e é aqui que costumam surgir os problemas. O jovem adulto, se é inflexível quanto ao "modo como as coisas deviam ser", costuma ficar bravo com o mundo por ele não corresponder às suas expectativas e exigências.

Confiança. Quando tiver oportunidade, observe duas crianças se encontrando pela primeira vez. Começam timidamente, até se interessarem uma pela outra: mas, se esse interesse for suficientemente forte, não tardarão a ser amigas. Por quê? Porque confiam uma na outra.

Se você costuma reagir "friamente" quando conhece alguém, isso talvez signifique que seus instintos infantis, naturalmente confiantes, foram corroídos pela desconfiança, o que pode ter origem numa falta de confiança em si próprio, dolorosa fonte de conflito interno. Para aprender a apreciar todas as pessoas que lhe são apresentadas, você vai ter de se deixar levar por você criança.

Esta semana,  faça o possível e o impossível por conhecer pelo menos uma pessoa que seja muito diferente de você. Se for professor, apresente-se a um operário, ou pare para bater um papo com o jornaleiro da esquina. Confie em que você e ele hão de tirar o melhor proveito da situação. Não se esqueça de que também haverá uma criança se debatendo em seu interlocutor, e que essa criança não deixará certamente de pressentir sua sinceridade - desde que você se sinta à vontade consigo mesmo.

Estes cinco caminhos ajudá-lo-ão a reencontrar a criança que se perdeu em você - essa criança que sabe como lidar de maneira mais eficiente e feliz com tudo e todos que encontra, liberta de atitudes preestabelecidas. Permitindo-se recapturar essa essência da infância, você vai conseguir ficar em paz consigo mesmo e manter o seu coração eternamente jovem.



(texto publicado na revista Seleções nº 136 - tomo XXIII - setembro de 1982)

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