sexta-feira, 8 de abril de 2016

Escravo do Instagram - Walcyr Carrasco


Analiso meu Instagram, ele me espelha. “Diga-me seu Instagram e eu te direi quem és”


Acordo. Escovo os dentes. Tomo banho. Olho meu Instagram, @walcyrcarrasco. Não necessariamente nessa ordem, pois durmo com o celular do lado. Criei uma série de atividades. Sempre capturo uma frase, de um grande autor, para a primeira postagem do dia. Sigo mais de 1.000 pessoas. Em meu celular surgem imagens contínuas e desconexas. Uma foto de @erasmo.mbt e eu me flagelo porque fujo da academia. Erasmo e também @jonas.mbt praticam o mahamudra, um treinamento que une ioga a exercícios variados. Contorcem o corpo como os gatos. É tudo que eu queria ser. É tudo que não serei. Até entrei em contato com Erasmo. Ele me convidou para assistir a uma aula. Aceitei e não fui. Acho que me apoiar nas mãos não vai dar. A pança desequilibra. Erasmo é par de @gabrielapugliesi, que tem milhões de seguidores, dá dicas de nutricionismo e atividade física. É linda. O casal prova que atividade física modela o corpo. Mas eu? Na próxima encarnação, talvez.

A imagem seguinte vem de uma galeria de arte asiática. Mostra a face de um demônio amarrada com couro. Admiro essa arte bruta e estranha, me detenho alguns segundos.

Em seguida vem uma atriz sorridente e loura, da novela que escrevo,Eta Mundo Bom! A atriz Flávia Alessandra (@flavialreal) também tem milhões de seguidores e mostra uma cena de gravação. Clico no coraçãozinho do lado esquerdo da tela. Se eu não curtir minha própria novela, quem curtirá?

Em seguida, imagens sucessivas me preocupam. Um amigo que estava sem dinheiro algum, num barco em Angra dos Reis. Depois, numa ilha! Sei das coisas da vida. Mando mensagem, pergunto o que está acontecendo. Ele:

– É amizade.

Pulo depressa para outra imagem. Uma poesia. O Instagram está provocando um renascimento da poesia. São rápidas, mas de qualidade. Gosto muito de @zackmagiezi. Não nos conhecíamos, mas já nos falamos. Vai publicar um livro, graças ao sucesso no Instagram. Matheus Jacob em @homemquesente também é ótimo. O @blogdolucao tem estilo. Há também uma série de Instagram literários, como @trechosdelivros, @instafrases. Para minha surpresa, com milhares de seguidores.

O ator @chaysuede posta fotos originais, sempre. A de hoje mostra uma zebra de óculos. Alguém postou a capa de um de meus livros. Imediatamente, dou um repost. O repost é uma forma de homenagem.

Na próxima imagem, um homem quase pelado. Explico: no Saint Valentine’s Day fiz uma brincadeira. Achei a imagem de um rapaz nu, na praia, apenas com um buquê de flores escondendo as ferramentas. Em meu post brinquei, perguntando se as mulheres não gostariam de receber flores assim. Foi uma enxurrada de comentários. Só que o modelo @vito_brasil era daqui mesmo. Mora em Los Angeles, entrou em contato agradecendo. Nos tornamos amigos de “insta” e nos seguimos. Também sigo o site de onde tirei a foto. Descobri que homens seminus ganham muito mais curtidas. Mais que mulheres, muito mais. Eu adoraria botar uma foto seminu e ganhar milhares de seguidores. Só que não posso. Sou um senhor respeitável. Nem atrairia olhares cobiçosos.

Imagens de livros, sigo várias editoras. Cachorros, bichos variados. Patricinhas que mostram o que é fashion, em inglês. O @hugogloss que se tornou um fenômeno, comentando imagens com um humor único. Sei que há gente que vive do Instagram. Cobra alto para posts divulgando produtos. Quanto mais “likes” ou curtidas, mais caro.

A essas alturas já está anoitecendo e descubro que praticamente passei o dia verificando meu Instagram. As curtidas do meu post. É vício, pois não consigo passar minutos sem olhar. Chegou minha vez. Estimulado, também comecei a escrever minipoesias. Só para postar. Adoro os comentários! Sento e escrevo. Fotografo e dou um post. Meu maior sucesso, porém, são as fotos de comida. Quebro o regime em todas as refeições. Boto a foto do prato e me lamento. Vem uma enxurrada de comentários. Alguns dizem que nem faço regime. Faço, só que fujo em todas as refeições!

Não leio tantos livros como antes, confesso. Mesmo assim, o Instagram se tornou uma janela para o mundo. Sigo a moça do posto onde paro quando vou para o Rio de carro. Sigo poetas, modelos, atores, escritores, pintores e tatuadores. (Adoro ver tatoos, mas não tenho nenhuma, acho que dói!) Confesso. Tornei-me escravo dessas imagens e frases contínuas. Analiso meu Instagram, ele me espelha! O velho ditado já pode ser traduzido: “Diga-me seu Instagram e te direi quem és!”.

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