terça-feira, 27 de dezembro de 2016

A arte de reinventar-se - Tatiana Ferrador



"Nunca desista. Mesmo que o mundo te fale ao contrário, acredite sempre"

Sabe aquele ditado popular que diz que se avida lhe der limões, faça uma limonada? Então, foi isso mesmo que Susana Schnarndorf fez quando recebeu o diagnóstico de Múltipla Atrofia do Sistema, doença degenerativa.

A atleta paralímpica começou a nadar aos 11 anos de idade, ainda que a preferência de sua mãe fosse, na verdade, o balé. Determinada, fez valer sua vontade e começou a treinar duas vezes por semana na escola de natação Tibungo, em Porto Alegre (RS). Logo passou a ir todos os dias. Sua paixão era a água, assim como a de seus irmãos, que praticavam canoagem, e de onde tirava sua inspiração.

Seu desempenho melhorava progressivamente e logo vieram as competições. Aos 12 anos, já pela escola Mauri Fonseca, cujo proprietário homônimo era o ex-nadador olímpico e um dos técnicos de natação mais respeitados do Rio Grande do Sul, recebeu um convite dele para treiná-la.

Até hoje atribui aos seus ensinamentos o mérito de conhecer os verdadeiros princípios para conquistar suas metas na natação. "Ele sempre me dizia que treinar era como construir um muro, cada dia vai-se colocando um tijolinho e quando faltam tijolinhos, o muro cai", lembra.

Já aos 18 anos, Susana foi convidada a nadar pelo Minas Tênis Clube em Belo Horizonte (MG), onde ficou até os 21 anos. Durante esses três anos, teve posição de destaque na natação infanto-juvenil brasileira, mas devido ao excesso de esforço, lesionou seus joelhos e se afastou das piscinas.

De volta à casa dos pais, em Porto Alegre, não conseguiu ficar parada, e durante sua reabilitação, conheceu o triatlo. Começava, então, o aprendizado em uma nova modalidade aos 24 anos.

Graças ao apoio do pai, Ervino Schnarndorf, foi ao Paraguai comprar sua primeira bicicleta. A partir daí, começou a treinar e disputar algumas provas nacionais. Mudou-se para o Rio de Janeiro e teve em sua carreira 13 ironmans, sendo cinco vezes campeã brasileira durante 14 anos na prática esportiva. Casou-se, teve três filhos, separou-se em 2005 e foi acometida de uma grande depressão.

Sintomas 

Engasgos e falta de coordenação. Esses foram os primeiros sinais de que algo não estava bem com sua saúde. Não conseguia mais cuidar das crianças, tampouco prosseguir na sua carreira como triatleta.  Diagnósticos imprecisos e díspares a fizeram pensar que sua vida estivesse chegando ao fim e, por algumas vezes, ganhou a sentença de morte ao ouvir as mais variadas análises, como lúpus, esclerose múltipla, Parkinson, entre outros. "Foram anos muitos difíceis, principalmente por me separar dos meus filhos", conta ela.

Foi apenas em 2010 que veio um diagnóstico mais assertivo: Múltipla Atrofia do Sistema, doença degenerativa. O que seria motivo de conformismo e desânimo, tornou-se uma mola propulsora, e Susana foi incentivada a voltar a nadar. Assim, procurou o mesmo clube em que treinava triatlo e sem nenhuma pretensão, conheceu a equipe de natação paralímpica, que estava treinando ali.

Recebeu o convite do técnico da equipe para treinar com eles. Susana não hesitou e, mesmo se sentindo fora de forma, já com 40 anos, aceitou. Tentou a classificação e foi elegível na classe 58 para a natação paralímpica. Vale lembrar que quanto maior o número de classe (de 10 a 0) menor é o comprometimento da deficiência.

O que Susana não esperava era que bateria cinco recordes brasileiros logo na primeira competição. Passou a integrar a seleção brasileira de natação paralímpica e representou o País nos Jogos Paralímpicos de Londres, em 2012, conquistando o quarto lugar no nado peito.

Já em 2013, foi eleita a melhor atleta paralímpica do ano, pelo Comitê Paralímpico Brasileiro (CPB), após bater o recorde mundial nos 100 metros nado peito - classe SB6, em Montreal, Canadá. "Tirei força nos meus filhos, nado por eles e para eles. A natação é meu remédio diário", diz a nadadora.

Os anos de 2014 e 2015, foram outra prova de superação para Susana, pois sua doença progrediu e seus resultados caíram drasticamente. Desistir? Não, essa palavra não faz parte de seu dicionário. Ela, no entanto, precisou passar por uma reclassificação e, atualmente, encontra-se na classe S5.

Determinada, hoje, aos 49 anos, atingiu o índice para os Jogos Rio 2016 em sua nova classe e comemora a alegria de poder competir "no quintal de casa", como diz.

"Ter meus filhos, minha família e meus amigos na arquibancada é algo que não tem preço. Vou realizar o maior sonho da minha vida e espero dar a vitória para eles", afirma, enquanto segue treinando rotineiramente com a equipe em São Caetano do Sul (SP). E deixa ainda uma dica a todos que estão passando por algum tipo de dificuldade. "Nunca desista. Mesmo que o mundo te fale ao contrário. Acredite sempre." E ela está certa, não?



(texto publicado na revista Ponto de Encontro nº 63 - ago/set de 2016)

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