domingo, 13 de setembro de 2015

Para gostar de ler - Fernanda Cury


Os livros abrem portas para um mundo mágico ao qual, infelizmente, a maioria das pessoas ainda não tem acesso no Brasil. Conheça seis ações que estão mudando esse cenário

A leitura é uma incrível jornada na qual a pessoa desvenda,  página a página, um universo rico em fantasia, suspense e romance. Ler estimula a criatividade, enriquece o vocabulário e amplia o mundo de oportunidades. Quem lê se sai melhor nos estudos e, depois de adulto, tem mais chance de conseguir bons empregos. Mesmo diante de tantos benefícios, poucos brasileiros são adeptos fiéis desse ha´bito. Segundo a terceira edição da pesquisa Retratos da Leitura no Brasil, realizada pelo Instituto Pró-Livro, o leitor brasileiro lê, em média, quatro livros por ano - o índice entre os espanhóis, por exemplo, é de 10 obras nesse mesmo período.

É uma questão cultura. De acordo com a mesma pesquisa, 85% dos entrevistados gostam de ver televisão no tempo livre. Escutar música e encontrar os amigos são outras opções destacadas. Ler um livro ocupa apenas a sexta posição no ranking.

Esse resultado sugere que, por aqui, grande parte das pessoas ainda enxerga a leitura apenas como uma obrigação - para estudos ou trabalho -, e não como diversão. Há quem acredite que a metodologia escolar tem sua parcela de culpa nesse comportamento. "Os professores costumam indicar livros clássicos do século 19, maravilhosos, mas que não são interessantes para um jovem de 15 anos, por exemplo", diz Zoara Failla, do Instituto Pró-Livro. "Apresentando só as obras completas, distantes do seu interesse, corre-se o risco de o estudante associar a leitura a algo tedioso, que ele faz por obrigação e sem prazer, e que é abandonado quando sai da escola."

Outro fator que influencia nesse quadro é a falta de acesso aos livros. Segundo dados do Sistema Nacional de Bibliotecas Públicas de 2014, o Brasil tem apenas uma biblioteca pública para cada 33 mil habitantes, sendo que em Manaus, por exemplo, o número sobe para uma acada 1,58 milhão de pessoas. Livrarias são 3.073 em todo o país - dois terços delas concentradas na Região Sudeste -, de acordo com a Associação Nacional de Livrarias (ANL).

Como tornar mais prazeroso o hábito de ler e ampliar o acesso aos livros? Investigamos seis projetos que encararam o desafio de não deixar essa questão sem resposta, seja apostando em alternativas para suprir a carência de títulos para os que já leem, seja tornando o hábito mais atraente. 

Solução 1

Criar bibliotecas comunitárias

- Responda rapidamente: o que um açougue tem a ver com livros?

Segundo Luiz Amorim, tudo. Morador de Brasília, ele trabalha como açougueiro desde os 12 anos. Durante o período em que morou nos fundos do estabelecimento, lia para passar o tempo. Acabou apaixonado pelos livros. Quando finalmente conseguiu comprar o açougue, em 1994, instalou uma pequena estante no local. Logo a ideia empolgou outras pessoas, que doaram exemplares ao então Açougue Cultural T-Bone, o primeiro estabelecimento no mundo a juntar carnes e livros. Tempos depois, a ideia se expandiu. A Parada Cultural - Biblioteca Popular 24 horas disponibiliza uma minibiblioteca em cada ponto de ônibus de Brasília, para que os usuários de transporte coletivo tenham acesso à leitura. O empréstimo é gratuito e, depois, basta devolver o exemplar em qualquer ponto.

Solução 2

Contar histórias infantis

Em 1993, o paulistano Valdir Cimino começou a ajudar as crianças do Hospital Emilio Ribas, comprando brinquedos e colaborando na organização das festas. Com o tempo, o interesse pelos pacientes aumentou, e ele passou também a contar histórias aos pequenos. Aos poucos, outras pessoas se interessaram em participar do projeto, que se transformou na Associação Viva e Deixe Viver. Em 17 anos de atuação, a entidade já beneficiou mais de 600 mil crianças e adolescentes em 90 hospitais do Brasil. Seus voluntários passam por um treinamento durante aproximadamente sete meses, período no qual se preparam para levar conforto e diversão aos pequenos pacientes por meio de leitura de obras infantis, brincadeiras e muito bom humor. Dessa forma, transformam a internação hospitalar num momento mais alegre e agradável e contribuem para o bem-estar do doente e de seus familiares.

Solução 3

Ampliar o acesso aos livros

Apaixonado pelo universo literário, certo dia Felipe Brandão deparou com sua estante abarrotada. Em vez de comprar um novo móvel para acomodar sua biblioteca, preferiu exercitar o desapego de uma forma criativa. Baseado no conceito americano Bookcrossing, criou o movimento Esqueça um Livro. A ideia é simples: basta deixar um exemplar em um local público, tirar uma foto e compartilhá-la nas redes sociais. "É importante colocar um recadinho, para que quem encontrar o livro entenda a dinâmica. Também é possível baixar um marcador com as explicações em nosso site", lembra. O projeto já conta com mais de 30 mil seguidores. "Realizamos eventos para troca de livros e inauguramos uma estante fixa em São Paulo. Logo mais, pretendemos montar uma biblioteca para uma instituição em Diadema (SP).  Queremos transformar o mundo em uma grande biblioteca!", conta.

Solução 4

Levar livros a quem não tem

A historiadora Sylvia Guimarães, junto com duas amigas, embarcou, em 2001, para uma aventura pela Amazônia. O objetivo: conhecer a fundo a natureza cultural e educacional da região. "Impressionadas com aquela realidade, decidimos incentivar a leitura em cada uma das comunidades visitadas", conta Sylvia. Foi então que nasceu o Programa Expedição, da Associação Vaga Lume. Ela promove o acesso ao livro e à leitura em 158 comunidades rurais de 23 municípios da Amazônia Legal brasileira, além de valorizar a cultura local. O projeto envolve ainda a doação de livros, estantes e esteiras para a estruturação de uma biblioteca comunitária e conta com a ajuda de toda a comunidade nesse trabalho - desde a manutenção da biblioteca até a organização de assembleias para discutir temas de interesse coletivo.

Solução 5

Tornar a leitura mais instigante

Muita gente torce o nariz para os livros por achar que ler é um ato silencioso e solitário. Para mudar essa impressão, a atriz Élida Marques criou, em 2003, o programa Ler É uma Viagem, que promove diversas atividades que congregam pessoas em torno da literatura, como saraus, recitais e sessão de leitura com música ao vivo. No piquenique literário, por exemplo, pessoas de diferentes estilos e idades se reúnem em uma praça ou parque para ler e se emocionar com as histórias de Monteiro Lobato e Guimarães Rosa, entre outros autores.  Assim, acompanhada de música, figurino e atores, num clima animado, a leitura desperta diferentes sentidos e estímulos. Até hoje, já foram realizadas mais de 500 apresentações, que reuniram cerca de 30 mil pessoas. Uma coisa é certa: todos que participaram foram sensibilizados pelo prazer que um bom livro pode proporcionar.

Solução 6

Incluir os deficientes visuais

Cega desde os 17 anos, Dorina de Gouveia Nowill sentiu por experiência própria a dificuldade de encontrar livros para pessoas com deficiência visual no Brasil. Incomodada com essa carência e ansiosa para realizar seu grande sonho de se tornar uma professora, ela foi á luta e iniciou um trabalho pioneiro para que publicações em braille e a alfabetização por esse método chegassem ao país. Assim nasceu a Fundação Dorina Nowill para Cegos, atualmente uma referência na produção de materiais acessíveis nos formatos braille, fonte ampliada, áudio e digital Daisy, distribuídos gratuitamente às pessoas com deficiência visual e a mais de 2500 escolas, bibliotecas e organizações em todo o país. Dorina faleceu em 2010, mas sua fundação, hoje comandada por Adermir Filho, segue a todo vapor, com soluções para que aqueles que sofrem com a dificuldade de enxergar possam ter acesso à leitura.

Faça a sua parte

Inove nos presentes

Tem um aniversário nos próximos dias? Presenteie com um bom livro. Mesmo que seu amigo não seja um leitor assíduo, há temáticas que sempre agradam, como fotografia e turismo.

Dê o exemplo

É na infância que a criança desenvolve o gosto pela leitura. Como os pequenos copiam os hábitos dos pais, demonstre a seus filhos que ler é uma atividade atraente e prazerosa.

Monte um clube do livro

Proponha a seus amigos a leitura de determinada obra e, depois, reúnam-se para discuti-la. Essa dinâmica possibilita a troca de ideias e a descoberta de novos estilos de livro.

Incentive desde cedo

Em vez de brinquedos, dê livros às crianças. Alguns, de plástico, podem ser levados para o banho, outros têm imagens tridimensionais. Os pequenos adoram.

Faça circular

Deixe de lado o hábito de colecionar obras na sua estante. Acabou de ler um livro fantástico? Ofereça o exemplar a um amigo ou doe a uma biblioteca comunitária

Você sabia?

Que a Bíblia é o livro mais lido no Brasil? E que as mulheres leem mais do que os homens por aqui? Enquanto 53% delas são leitoras assíduas, o índice entre eles é de 43%.




(texto publicado na revista Sorria para ser feliz agora nº 45 - set/out de 2015)

Nenhum comentário:

Postar um comentário