Sonhar pequeno, pensar apenas nas dificuldades, desistir antes de tentar. Um pacote assim boicota nossa felicidade. Pior: muitas vezes a gente nem percebe o que está fazendo. Especialistas ensinam a diagnosticar e combater a postura nociva
A cena é corriqueira. Ao se imaginar com a roupa, daquele estilista consagrado, passeando um mês inteiro em Paris e Londres, seduzindo o alvo de todos os olhares do pedaço ou sendo promovida a um alto cargo agora vago na empresa, a pessoa se pergunta: "Quem sou eu para merecer tanto?" O questionamento pode parecer inofensivo, mas indica um certo complexo de inferioridade que afugenta oportunidades incríveis e a chance de alcançar merecidas realizações. Muita gente até acredita que pensa grande, embora, no fundo, apenas se refugie na imaginação. "Sonhos grandiosos demais consolam vidas medíocres", provoca o psicanalista Jorge Forbes, de São Paulo, autor do livro Você Quer o Que Você Deseja? (Best Seller), já na décima edição. E ele explica a contradição: " A maioria sonha além, mas age aquém do que poderia". Sim, é preciso querer mais,, sempre mais - sem, no entanto, perder o contato com a realidade. Senão, a perspectiva do impossível atrapalhará ou impedirá a ação. "Ficar repetindo para si quanto a vida seria maravilhosa se tivesse isso ou aquilo apenas adia novas conquistas. Nessa ladainha de se contentar em imaginar aquela viagem ou a casa na praia, o amanhã nunca chega, o tempo passa e o que é importante não se realiza mesmo", ele alerta. Resultado: a vida parecerá cada vez mais sem sal. Tristeza, desânimo e frustração costumam ser sinais de que estamos nos contentando com pouco. "Mas também são sintomas claros de que não estamos fazendo nada para mudar isso", avisa Adriana Medeiros, doutora em psicologia e autora de O Dia da Mudança (Papa-Livro). "A vida é curta para ser insatisfatória." A seguir, os experts dão lições preciosas para saber desejar (e conseguir) tudo o que você merece.
1) Elimine a frase "É difícil para mim" do seu vocabulário
Quem costuma responder a convites para jantar, participar de um projeto, fazer um curso por hobby ou ir a uma festa e conhecer gente nova com "É difícil para mim" tende a se contentar com menos do que merece em todas as áreas. "Essa é uma forma de transformar qualquer desejo em sonho impossível", analisa Forbes. A negativa pronta, sempre na ponta da língua, serve como um escudo para se proteger do novo. Tente fazer uma experiência: "Proíba-se por uma semana de falar "É difícil" ou frases assim. Diga apenas 'quero' ou 'não quero' e veja quantas possibilidades irão se abrir", sugere Forbes. "Será uma espécie de período de abstinência do vício de dar justificativas para tudo, o que criará uma conexão direta com seus desejos mais verdadeiros."
2) Não se pergunte "O que preciso ter para conseguir o que quero?"
Se fizer isso, você logo descobrirá que nem adianta sonhar com aquela super viagem, o negócio próprio ou uma mudança de carreira porque falta dinheiro, tempo, companhia, sócio, conhecimentos... Aí, pronto: bastam três segundos para desistir. A consultora Adriana sugere fazer outra pergunta: "É possível?" Sem derrubar seus sonhos de cara, a indagação também funciona como antídoto contra planos megalomaníacos. Exemplo? Se uma secretária de 40 anos quer ser atleta de elite, verá, ao se questionar, que isso não é factível, ainda que possa correr como amadora e até participar de maratonas. "Mas, se ela quiser realizar um desejo antigo de ser enfermeira e ajudar pessoas? Isso, sim, é possível, desde que se disponha a voltar a estudar", diz Adriana.
3) Controle o medo de obter sucesso e de ser notada
Acredite: esse temor é mais comum do que se imagina. Afinal, é muito mais confortável e seguro permanecer no mundinho que já estamos e conhecemos tão bem. É bom ter aquela agradável sensação de pertencimento, mesmo que seja a um grupo solidário apenas na dificuldade, na dor e no fracasso. Ok, estar no topo, sob os holofotes, pode significar tornar-se um alvo mais fácil de críticas e de inveja. Mas ter receio de brilhar por causa disso pode levar a um nefasto estado de estagnação, a parar de lutar por seus sonhos mais caros. "O medo do risco e de sair da acomodação induz à conclusão óbvia de que algo 'não é para mim'", afirma Forbes. "É perigoso ir atrás do que se quer." Sim, qualquer realização de trabalho, exige disposição para sair da zona de conforto e envolve perigos. Mas ousar vale a pena. "Só assim você terá a chance de inscrever no mundo sua singularidade, imprimir sua marca pessoal e intransferível, seja fazendo o que mais gosta, seja criando um filho, seja escrevendo um livro", acredita o psicanalista.
4) Reduza ao mínimo as queixas e aprecie suas realizações
Isso depende de empenho para manter sua autoestima em dia e para se livrar de generalizações que você já deve ter metido em sua cabeça e que limitam a iniciativa pessoal. "Só reclamar de um relacionamento insatisfatório, por exemplo, e não fazer nada para sair dele revela medo de ficar sozinha, aliado à crença na máxima que decreta 'ruim com ele, pior sem ele' - e isso é o que sustenta a acomodação. Também quer dizer que você não acredita ser merecedora das relações boas e saudáveis", avalia Adriana Medeiros. Para reverter o quadro, é preciso, antes de tudo, parar de reclamar. Depois, dirigir o foco para as conquistas feitas até aqui, dando o devido valor a elas. "Essas atitudes simples reforçam o amor próprio e alimentam a coragem", avalia a consultora. E acrescenta: "A felicidade é um estado de espírito, não depende de coisas externas. Você chegará a ela sabendo o que realmente importa para si, amando o que já conquistou sem se comparar com os outros e se perdoando por erros que fazem parte de qualquer percurso".
5) Mude de ideia: sonhos não se realizam por mágica
E você não terá uma vida impecavelmente feliz depois que se realizarem. O desejo de que tudo seja tão perfeito quanto imaginamos, do marido ideal à casa de cinema, causa frustração. A idealização embaça a noção de realidade e nos faz sonhar com o que é inatingível. Resultado: se não podemos ter a perfeição, podemos acabar nos contentando apenas com o que recebemos, ainda que não seja bem o que queríamos. Para não cair na cilada, saiba que as grandes realizações são sempre resultado de muito planejamento, empenho e suor, em um processo que envolve um punhado de tentativas e erros. Nada cai do céu. Então, comece a fazer planos detalhados e realistas para conseguir o que merece. Segundo Adriana, eles têm de levar em conta quatro recursos: 1. Físicos, ou saúde e disposição. 2. Emocionais, quer dizer, determinação e coragem. 3. Intelectuais, que se traduzem em capacidade de aprender o que for preciso. 4. Financeiros, ou dinheiro para o que quer. Se já tiver na mão, ótimo. Senão, sempre é possível levantar a verba necessária.
(texto publicado na revista Claudia nº 8 - ano 53 - agosto de 2014)
Nenhum comentário:
Postar um comentário