domingo, 7 de agosto de 2016

Ensinar e aprender mudou de forma. Mas segue o desafio de formar cidadãos conscientes


A era digital está transformando estilos de vida, comportamentos, relacionamentos familiares e sociais.

Crianças e adolescentes vivem em dois mundos, o real e o virtual. Nascidos a partir do ano 2000, são conhecidos como Geração Z.

O avanço da tecnologia mostra que o caminho da informação ao toque de um dedo chegou para ficar. Os nativos digitais têm uma relação inédita com todo o conteúdo que a rede tem para oferecer. De acordo com estudo da consultoria norte-americana Qmee, a cada minuto que passa são gerados, em média, 72 horas de vídeo no YouTube, 41 mil posts no Facebook e 3,6 mil fotos no Instagram.

As recomendações sobre o que fazer para transformar o uso da internet numa fonte mais segura, ética, educativa e saudável de conhecimentos e como ponte de diálogo entre as gerações devem fazer, agora, parte da rotina das escolas e famílias.

Verdadeiros desafios para os profissionais da educação e os pais, que precisam acompanhar as novidades criando formas de equilibrar o uso dessas inúmeras ferramentas de comunicação.

Nesta edição especial de Educação pedimos ajuda a educadores da região para abordar diferentes temas sobre esses comportamentos.

"Educar a criança e o jovem a viver presencialmente é um dos grandes desafios da educação. Temos experiências virtuais, mas nosso dia a dia é presencial, nós somos globais, mas acordamos em nossa casa, vivemos na nossa comunidade, mas vamos para a escola ou para o trabalho. Temos de ensinar as crianças a olhar nos olhos; a saber argumentar e a ser resilientes", explica Esther Carvalho, diretora-geral do Colégio Rio Branco. Esther defende que a criança precisa construir valores com base em reflexões que devem ser estimuladas na escola e dentro de casa, para que ela venha a ter uma experiência ética no ambiente virtual.

A educadora ressalta que os adultos têm o importante papel de apresentar referências positivas que estimulem o foco, em meio á crença da multitarefa, preservando a profundidade nas relações e nos saberes.

A idade ideal

Esther Carvalho atenta par os aplicativos voltados para os pequenos. "Para manter a atenção do bebê num restaurante, os pais lhe entregam um iPad, mas depois querem que o filho largue o celular ou o videogame. Então eu pergunto: que tipo de experiência você quer que seu filho tenha com a internet? Organizar o seu tempo online e ajudá-lo a administrar as atividades enquanto está navegando é fundamental", afirma ela.

Educar a atenção num mundo onde as crianças estão super estimuladas é um desafio. Criar mecanismos de foco em meio à crença da multitarefa - teoria que a neurociência desconstrói - (para a neurociência, o que existe é uma mudança rápida de uma tarefa para outra). Isso, certamente, prejudica o foco e a profundidade. "Os adultos são as grandes referências. E sabemos que não existem problemas nas redes sociais apenas com jovens e crianças", conclui.

No limite

Os limites tecnológicos são necessários. Se a criança precisa de foco, sono, organização e o celular ou o  computador não estão permitindo isso, os pais e os professores devem atuar. É uma organização que vem da escola e da família. "Nós usamos o celular em sala de aula com os mais velhos, mas deixando claro que a utilização é pedagógica. Em outros momentos não será permitido", conta a diretora-geral do Colégio Rio Branco.

Situação

Um pai com três filhas adolescentes recolheu os celulares das filhas antes de elas dormirem, pois não estavam tendo uma boa noite de sono e, consequentemente, acordando atrasadas.

"A criança nasce num ambiente digital onde é filmada o tempo todo e é o centro das atenções; ela cresce com este jeito facebook e instagram de ser; então, a gente vai criando personas e papéis neste novo contexto", explica Esther. Por isso, defende que a criança deve construir valores, a partir de reflexões que devem ser estimuladas na escola e dentro de casa, para que ela venha ater uma experiência ética no ambiente virtual.

A profissional encontrou uma forma inteligente de, literalmente, conectar a família, a escola e os alunos. Em encontros periódicos com os pais, a pauta em discussão é o uso de WhatsApp e Snapchat. "Uma escola conectada é uma escola consciente", deixa o recado.

Esther Carvalho - Colégio Rio Branco

A verdade nua e crua

Os desafios da tecnologia para crianças, jovens e educadores

- Estar no Facebook é permitido para maiores de 13 anos. E a família, muitas vezes, autoriza o menor a mentir a idade para se conectar à rede social.

- O cyberbulling é um pesadelo que ajuda a comprovar que o que se posta é para sempre e desperta para a responsabilidade nas redes.

- O relacionamento humano não permite a conexão e a desconexão em um clique. Desconectar-se de alguém, na vida real, pode ser doloroso e difícil. Valorize o olho no olho, mas incentivar todas as formas de relacionamento e interação é importante.

- Separar o que é novo do que é novidade. Para Esther, a escola deve se atentar ao que é novo, mas não necessariamente ao que é novidade.

- Não é preciso substituir o livro pelo iPad, mas usar todas as possibilidades e linguagens: a brincadeira, o lúdico, o vídeo, a internet, os livros, os desenhos. O que faz a diferença é o resultado que se quer tirar disso. Como eu construo formas consistentes de aprender e ensinar neste novo ambiente?

O fenômeno selfie nude

A troca de fotos com sugestão sensual, ou até mesmo em poses nuas, tornou-se comum, principalmente entre adolescentes. Eles acreditam que possuem domínio sobre aquela informação, que pode ser compartilhada em poucos minutos. Como abordar este assunto com alunos e pais? O que é escrito no WhatsApp vale como prova jurídica, o que é compartilhado no Snapchat se apaga, mas pode ser salvo por outras pessoas, o que é postado no Facebook, no Twitter e no e-mail pode ser visto e rastreado para sempre. O fenômeno selfie nude, popular entre os jovens, surgiu nos EUA e consiste em produzir e enviar fotos sensuais usando o celular. O artigo 241 do Estatuto da Criança e do Adolescente estabelece pena de 3 a 6 anos de reclusão para quem produzir, divulgar ou manter imagens pornográficas envolvendo menores de 18 anos.

Mas o que fazer quando é o próprio adolescente quem compartilha?

Dialogar e monitorar são as únicas opções. Tanto famílias como as escolas precisam ampliar o nível de consciência das crianças e dos adolescentes em relação ao assunto. O acesso precoce aos celulares e à sexualização são fatores que contribuem para o aumento dos casos. Como expor sua sexualidade para si e para o grupo? Compartilhando cenas íntimas! Quando a família dá ao seu filho um celular, deve discutir as regras, combinados e alertas. No entanto, a dimensão entre público e privado, idade adequada e responsabilidade, muitas vezes, não são abordadas.

Assim, as histórias se repetem. Uma menina que atendeu ao pedido do "Manda nudes!", quando tem aquela foto "vazada", fica exposta na classe, na escola e no mundo. A família e a escola, muitas vezes, tentam abafar ao invés de acolher, em uma tentativa ingênua de apagar uma história que a rede pode retomar sempre.

Cláudia Siqueira - Colégio Sidarta


(texto publicado na revista Circuito especial de educação - edição 200 - ano 16 - agosto de 2016)

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