sábado, 24 de janeiro de 2015

Marcio Gomes sobre prisão na Indonésia: “O encarregado riu da minha cara de susto” - Marcio Gomes (Revista Época)


Fui preso ao tentar cobrir o fuzilamento de Marco Archer e soube que poderia pegar até cinco anos de cadeia. Felizmente, só fui deportado

Era minha segunda cobertura de viagens do papa à Ásia. O cinegrafista Geovanne Saima e eu enviámos o material da chegada de Francisco às Filipinas, a festa do primeiro passeio de papamóvel por Manila. Foi quando soubemos que o traficante brasileiro Marco Archer seria executado pelo governo da Indonésia.

Na avaliação de nossa redação, no Brasil, o papa poderia estar em nossos telejornais com imagens das agências de notícias. Era importante ir para a Indonésia, contar essa outra história. Comprei passagem, num voo de Manila para Jacarta, sabendo que não estaríamos prontos como na viagem papal, com credenciamento de imprensa, vistos corretos - processo de semanas. Para a Indonésia, em cima da hora, o único visto que poderíamos ter era o de turista.

Chegamos a Jacarta nos primeiros minutos de sábado. Na imigração do aeroporto, preenchemos o formulário de identificação, citando nossa profissão, e recebemos o visto que já era esperado - turista.

Depois de sete horas de viagem de carro, no meio da manhã de sábado, estávamos em Cilacap, cidade onde fica o presídio, numa ilha. Havia muitos jornalistas no porto que dá acesso ao local. Éramos os únicos estrangeiros. Ficou fácil para quatro oficiais da imigração, sem uniforme, nos abordarem, querendo nossos passaportes. Eu estava no meio de uma entrevista. Ainda pedi para conclui-la. Eles permitiram.

Fomos levados para longe dali. No prédio da imigração, foram três horas de perguntas feitas por um encarregado. Ao fim do meu depoimento, imaginei que ele fosse nos dar uma bronca, trocar o visto e permitir a volta ao porto. Não foi o que ocorreu. Ele anunciou a apreensão dos documentos e me mostrou as punições a que estávamos sujeitos: cinco anos de prisão e pagamento de multa equivalente a R$ 52 mil. Ele riu da minha cara de susto. Teríamos de esperar no hotel uma decisão, sem poder trabalhar.

A fama da Indonésia, do rigor em suas penas, só é ultrapassada pela de país corrupto. Isto me assustava: temia ser julgado não apenas por meu erro, mas por quanto poderia valer. Aqueles homens estavam de tocaia no porto, desconfio que numa tentativa deliberada de impedir o trabalho de repórteres estrangeiros. Encontrei outros jornalistas brasileiros que também estavam com visto de turista - e preocupados, pois podiam ser pegos.

Nossa embaixada nos ajudou. O caso chegou a autoridades em Jacarta. Mesmo com os atenuantes, o prognóstico mais otimista era deportação. Na segunda-feira à tarde, fomos avisados: teríamos de deixar o país. Fomos fichados e seguiríamos viagem no carro deles - antes, houve um alerta de uma fonte segura: olhos nas malas para evitar que algo ilegal fosse colocado, num falso flagrante. Compramos cinco cadeados.

Os mesmos oficiais do porto ficaram conosco até o portão de embarque, no aeroporto de Jacarta. Foi quando recebemos os passaportes de volta e nos despedimos deles. O encarregado não sorriu.
























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