segunda-feira, 6 de junho de 2016

Aposentadoria cada vez mais longe - Cacilda Luna


Com a adoção da fórmula 85/95 progressiva para aposentadoria, a tendência no Brasil é de que as pessoas permaneçam mais tempo no mercado de trabalho antes de requisitar o benefício. Isso porque, como a idade mínima para se aposentar é baseada na expectativa de vida e o brasileiro está vivendo mais, vamos ter de trabalhar até mais tarde antes de penduras as chuteiras. Em 2014, segundo o IBGE, a expectativa de vida no país estava com 75,2 anos.

Mas a questão que se levanta é se as pessoas com mais de 50 anos terão espaço no mercado de trabalho até alcançar o tempo necessário para solicitar a aposentadoria. O Gente da FEA ouviu três especialistas da Faculdade: os professores Wilson Amorim e Tania Casado, do departamento de Administração, e Luiz Jurandir Simões, do departamento de Contabilidade. 

Wilson Amorim disse que o perfil demográfico da população brasileira vem mudando de forma muito rápida, com as famílias optando por terem menos filhos e, ao mesmo  tempo, os idosos vivendo mais. "Se a gente olhar com os olhos de hoje o que será do amanhã, vamos entrar em pânico." Enquanto na década de 1950, a maior proporção da população estava concentrada nas faixas de idade mais baixas, a projeção para 2050 é de inversão da pirâmide. "Vai haver, proporcionalmente, mais pessoas com 50 anos ou mais do que houve em qualquer outro período da história brasileira", prevê Amorim.

Uma das causas para o país ter menos jovens do que no passado, de acordo com o professor Luiz Jurandir Simões, é devido ao empoderamento feminino a partir da década de 1970. "Quando você empodera a mulher, ela não que saber do filho. Hoje ela tem no máximo dois".

A se confirmar as projeções demográficas, não haverá caixa suficiente par pagar todas as aposentadorias. "A gente vai ter que mexer na Previdência", afirma Wilson Amorim. Segundo o docente, para que nenhum dos grupos (jovens ou idosos) arque com o ônus sozinho, a questão deverá passar por uma ampla discussão da sociedade até se chegar a uma solução definitiva. Para Simões, "as pessoas terão de se conscientizar que estamos vivendo uma transição demográfica".

Mais dependentes

Outro ponto levantado pelo professor Wilson Amorim é a razão de dependência (número de pessoas em idade de dependência sustentada por pessoas em idade ativa). Segundo ele, pelas projeções do IBGE, a partir de 2026, haverá um aumento da proporção de pessoas dependentes por pessoas ativas (idade 15-59). Ou seja, muitos não terão condições de deixar o mercado de trabalho, mesmo tendo idade para se aposentar, porque ainda necessitarão sustentar pais e/ou filhos, uma situação que já se verifica em muitas famílias. É a geração que tem pouco mais de 50 anos, que a professora Tania Casado define como "geração sanduíche".

Especialista em gestão de pessoas, Tania Casado acredita que as pessoas com mais idade terão de se "reinventar" para continuar ativas no mercado de trabalho. "Não dá para o cara chegar aos 50, 60 anos, e achar que sabe tudo. Vai ter que estudar, que continuar aprendendo", opina. Para ela, essa é a chance de a pessoa realizar um sonho de  trabalho que não conseguiu no passado, porque está com a vida mais estabilizada. "Antigamente, a gente tinha o trabalho assim como uma missão. Hoje, o trabalho tem que estar alinhado com o que as pessoas querem fazer".

Para o professor Luiz Jurandir Simões outra opção é, depois da aposentadoria, as pessoas procurarem alternativas para complementar a renda. Ele citou, como exemplo, alugar quartos em casa. "Eu conheço vários casos. Tem gente fazendo empresa dentro de casa para cuidar de crianças, venda pela internet ou aula de inglês online. Temos atualmente alternativas interessantes de empreendedorismo para o idoso, porque ele tem formação, qualificação. O nível educacional do idoso hoje é maior do que a média das pessoas. No Brasil, as coisas se inverteram, a educação piorou".

Mercado de trabalho

Em recente palestra a um grupo de pessoas da terceira idade, o professor Wilson Amorim apresentou a realidade do mercado de trabalho para quem tem mais de 50 anos. Nas regiões metropolitanas, entre 2003 e 2015, o número de pessoas empregadas com 50 anos ou mais teve crescimento, de acordo com a Pesquisa Mensal de Emprego do IBGE. A porcentagem da População em idade Ativa (que tem idade para trabalhar) subiu 82,5%, a da População Economicamente Ativa (que procura emprego) subiu 86.9% e a de Ocupados aumentou 91,7%.

De acordo com Amorim, os números demonstram que há espaço no mercado de trabalho para os mais velhos. Porém, é possível se identificar pelos dados da RAIS-MTE (mercado de trabalho formal) em que setores há mais chances de colocação para as faixas etárias mais altas. Na administração pública, por exemplo, os trabalhadores acima de 50 anos são a maioria. No setor de serviços, observa-se um equilíbrio entre as faixas etárias. Já no comércio, a tendência é se contratar pessoas com menos de 50 anos.

Na pesquisa "As Melhores Empresas para se Trabalhar", conduzida por professores da FEA, se observa que a faixa etária com maior número de trabalhadores (36%) é a de 30-39, enquanto a faixa etária 50-64 detém apenas 7% dos postos de trabalho. "Podemos observar que quem não contrata o pessoal mais velho são as empresas mais estruturadas, de maior porte. Por alguma razão de natureza estratégica, elas preferem ter uma composição de mão de obra que não contempla essa mudança demográfica que a gente está observando no Brasil", conclui o professor Wilson Amorim.


(texto publicado no jornal Gente da FEA edição 106 - ano 12 - junho de 2016)

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