sexta-feira, 26 de setembro de 2014

Amigo para todas as horas e momentos - Diana Corso


Sobre os diferentes vínculos que estabelecemos com aqueles que estão sempre prontos para nos acolher

Você se separou, durante semanas chorou no ombro dos seus amigos, derramou toneladas de indignação contra aquela pessoa egoísta e sem caráter que amou. Você arrolou as razões pelas quais já devia ter percebido que aquilo não ia dar certo. O amigo acolhe, consola, diz que você merece alguém melhor. Só que o casal se reconcilia e ao amigo cabe brindar à felicidade dos pombinhos. Ou ainda, você está entusiasmado com um novo projeto mirabolante. Vai, mais uma vez, desfazer algo que estava funcionando. É assim que você sempre faz: destrói tudo o que construiu. Ao amigo cabe acompanhar o novo sonho.

É claro que os amigos tentam avisar, em geral, quando consultados, por vezes à queima roupa. Eles alertam que essa relação é nociva, que você se desencanta de tudo o que conquista. Somos grilos falantes, lúcidos no que diz respeito à vida alheia. Sábios de plantão, nos iludimos: tudo indica que finalmente o amigo problemático está escutando a voz da razão. Porém, raramente ele segue esses conselhos, o que fica na memória não é a esperteza das palavras, é a certeza da presença, do afeto fraterno. Nas verdadeiras amizades, o que faz diferença é suportar as besteiras que o outro comete.

É por isso que não é a mesma coisa conversar com um amigo e com um terapeuta. Do primeiro queremos amor, já com o terapeuta falamos porque desconfiamos que há algo significado nas nossas trapalhadas. Amores tampouco cumprem essa função: sócios na empreitada da vida, o destino daqueles que se comprometem é enlaçado, por isso tendem à intolerância. Já a amizade não é eficiente para questionar, serve para acolher.

Amigos são como um zoológico, onde a variedade valoriza. Há aqueles com os quais só rimos, outros são parceiros para viajar, há os que se materializam nos momentos de dor, outros que abrilhantam as comemorações, os que servem para fazer algo juntos, enquanto há os que são legais mesmo para confidências. São de diversos tipos porque também somos incoerentes e multifacetados.

Está certo, além da amizade precisamos de alguma escuta que nos ajude a refletir, assim como andamos sempre em busca de amores que remem junto no barco da vida. A carência é enorme, precisamos de muitos e diferentes tipos de vínculo, por isso vale a pena aprender a ser tolerante com a amizade: ninguém pode ser tudo, há momentos para paquidermes, outros para felinos, ou primatas. Sempre me pergunto que tipo de bicho sou para todos aqueles que amo, mas lhes agradeço a infinita paciência.



(texto publicado na revista Vida Simples nº 148 - agosto de 2014)


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