O papa diz compreender o "efeito tóxico na fé" que os crimes de pedofilia cometidos por sacerdotes causam em suas vítimas
O papa Francisco proferiu, na semana passada, as palavras mais duras e diretas contra a pedofilia saídas da boca de um pontífice. "Estou profundamente machucado pelos pecados gravíssimos de abusos sexuais cometidos por membros do clero e, humildemente, peço perdão", disse, em missa de homilia conduzida na última segunda-feira. Pouco depois, o papa se encontrou com um grupo de três homens e três mulheres - irlandeses, ingleses e alemães - que sofreram abusos sexuais cometidos por membros da Igreja. A eles, Francisco pediu desculpas pela "omissão por parte de líderes católicos que não responderam a denúncias" e declarou compreender que os crimes produzem "um efeito tóxico na fé e na esperança".
As palavras de Francisco reforçam os sinais de que a Igreja Católica está decidida a conduzir uma limpeza interna que mira, além dos padres pedófilos, também os membros do sacerdócio envolvidos em casos de desvio e lavagem de dinheiro. Essa postura, que visa a aproximar a igreja de seus fiéis, inclui a abordagem de temas controversos e antes evitados, como a homossexualidade e o diálogo com outras religiões, como o islamismo e o judaísmo.
Após a missa, cada vítima de abuso conversou com o papa por meia hora. A alemã Marie Kane, de 43 anos, relatou que foi ouvida atentamente: "Até que pessoas como Sean Brady (cardeal irlandês acusado de acobertar casos de pedofilia) sejam punidas, não acreditarei em mudança". A falta de punição é queixa compartilhada pelas vítimas. Diz o americano Ken Smolka, de 70 anos, que afirma ter sido atacado por um padre em 1958, e que não estava no grupo recebido: "Os pedófilos devem passar o resto da vida rezando pelas vítimas".
Denúncias contra padre pedófilos começaram a vir à tona nos Estados Unidos no papado de João Paulo II, em 2002. Até 2010, a postura da Igreja foi mitigar o escândalo. Bento XVI endureceu as regras e incluiu o abuso sexual na categoria de crimes mais brutais entre os delitos canônicos. Dentro da Igreja, a pena chega a expulsão do sacerdócio. No âmbito criminal, a punição corre de acordo com a Justiça do país em que o delito ocorreu.
Nos últimos três anos, ao menos 400 sacerdotes foram expulsos por acusações de pedofilia. No mês passado, o arcebispo polonês Jozef Wesolowski foi condenado pelo abuso de menores, entre 2008 e 2013, na República Dominicana. Trata-se do mais alto sacerdote a ser punido. As vítimas acham puco. De 3420 denúncias tidas como verossímeis pelo Vaticano na última década, menos de um terço resultou em penalidades.
(texto publicado na revista Veja edição 2382 - ano 47 - nº 29 - 16 de julho de 2014)
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