segunda-feira, 29 de dezembro de 2014

Questão de escolha - Danuza Leão


As pessoas gostam de sofrer - eu acho. Quantas vezes dei o ombro para uma amiga (para uma, não; para várias) chorar, desesperada, porque o homem por quem estava apaixonada tinha ido embora? Penso em como a vida seria mais lógica - e melhor - se as pessoas gostassem somente de quem gostasse delas. Eu já atingi (quase) esse estágio celestial: sou de gostar só de quem gosta de mim. E não estou falando de amores, mas de tudo.

Suponhamos que você vá ao banco e a moça que atende não seja tão gentil como devem ser todas as pessoas que lidam com o público em geral. Ok, vamos dar um crédito a ela, que pode ter começado uma briga com o filho logo de manhã e nem ter conseguido tempo de terminar, pois precisava sair correndo para trabalhar. Se você olha e sente que o clima não está dos melhores, dê uma disfarçada e se dirija àquela outra coisa, que parece ter acordado achando a vida dela a melhor de todas as coisas. Ela vai dar as informações de que você precisa sempre com um grande sorriso estampado na cara; e não vai ser melhor assim?

Na vida pessoal, é quase igual. Às vezes, sem nenhum motivo, seu santo não cruza com o de outra pessoa. Se ela falar com você cheia de gentilezas e gracinhas, por mais que seja simpática, você vai implicar. Por quê? Por nada, ora.

Mas tem pior, e essa dói: é quando você admira uma pessoa e gostaria, sinceramente, que fosse sua amiga, mas não rola. A gente se sente rejeitada, não entende a razão, fica triste de verdade. Mas não deveria. Deveria é pensar que nem todo mundo tem obrigação de gostar da gente e, se uns não gostam, outros gostam. E pode ser perfeito tomar uma atitude meio infantil. Lembre-se de como faz a criança, que sabe das coisas. "Se a pessoa não gosta de mim, então também não gosto dela", decide.

E há a família, tema que nunca terá fim. Aquela prima que você odeia. Ok, odeia é exagero, mas vocês não se veem nunca porque não têm nada em comum, nenhum assunto. E o pior: ela é sua fã. Numa reunião familiar, assim que ela a vê, dá um jeito de ficar perto e não há generosidade que faça você conversar com ela. Então, logo que pode, pede licença e vai para outro canto. É certo? É compreensível? A resposta é não, até porque não há motivo para que seja assim. Só que é. E a sobrinha de 3 anos que adorou sua bolsa porque tem um passarinho como enfeite? A garotinha não larga você, querendo o passarinho para ela - sob o olhar complacente da mãe. Afinal, o que é um passarinho diante da felicidade de uma criança? Mas acho que o capítulo família já pode ser encerrado, pois daria um livro, não uma crônica.

E tem aquela clássica de numa festa chegar uma mulher muito bonita e simpática, nova no pedaço e por isso mesmo meio desenturmada. Você, por generosidade, deveria chegar perto, mas não chega. Seu santo não bate com o dela - talvez aí já seja por outras razões.

Pense em quantos sofrimentos poderiam ser evitados, em quantas lágrimas deixariam de rolar e na bobagem de ficar noites em casa esperando por um telefonema que não veio (aqui estou falando de amores, claro). Seria tão mais inteligente, tão mais maduro, tão mais saudável você simplesmente aceitar, sem drama, que ele não gosta mais de você - uma razão suficiente, aliás, para você deixar de gostar dele.

De pessoas masoquistas o mundo anda cheio - e você não precisa ser uma delas.




(texto publicado na revista Claudia nº 11 - ano 52 - novembro de 2013)

































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