Reações dos bichos a situações difíceis ou estressantes surpreendem seus donos
A artista plástica Tereza Camargo tem duas cachorrinhas poodles com quem divide seu carinho e disponibilidade. Rossi e Nala refletem o humor e a personalidade de sua dona, são alegres, festivas e barulhentas. Estão sempre em busca de um colo, exigem atenção constante e choram descontroladas quando são ignoradas. Lola é uma beagle curiosa e simpática. Mas sempre que há uma brecha, quando sua dona, a pedagoga Beatriz Bueno, se distrai, ela sobe na mesa de jantar e leva à boca o que encontra pela frente. O cachorrinho Simba foi um presante da fonoaudióloga Cinthia de Sá para os filhos Guilherme e Fernanda. No início, o cãozinho estava quase sempre acompanhado da família. Mas, nos momentos em que precisava ficar sozinho, invariavelmente acabava estressado e, em retaliação, marcava todas as paredes, sofás e camas com compridos "xixis"...
Melhor amigo do homem
O que há por trás do comportamento de Nala, Rossi, Lola e Simba? Mais do que animais de estimação, os cães fazem parte da vida das famílias brasileiras. Atualmente, cerca de 60% delas possuem cachorros interagindo continuamente, numa rotina onde ora o animal é dominado, ora ele domina. Mas qual é o mecanismo que aciona comportamentos e reações diversas entre eles? Esses seres inteligentes e sensíveis percebem o perfil de seus donos? São capazes de se alegrarem ou se entristecerem com eles? Eles sofrem? O veterinário e escritor Marcel Benedeti no livro Todos os Animais Merecem o Céu relata a história de Boris, um cão cego, e seu dono, personagem do livro e também veterinário, Guilherme. Boris, numa ocasião, para festejar a presença de seu dono, suja a calça do médico antes de ele sair atrasado para o trabalho e é duramente repreendido. Boris passa o dia encolhido, deprimido com a atitude e só retoma a alegria quando perdoado.
Troca de energia
O encantador de cães mexicano César Millan, especialista em comportamento e psicologia canina, alega que os animais captam nossas emoções e, assim, são como espelhos, refletindo a alegria, a ansiedade, a agitação ou a calma de seus donos. Como a linguagem dos cães se baseia em energia, tudo o que fazem e refletem é com base nessa energia percebida, captada e refletida. Quando se adota um bichinho, torna-se responsável por ele em tudo e isso significa a satisfação física, emocional e psicológica do animal, como alimentação, saúde, recreação, etc. Portanto, é natural que, quando não são supridos esses quesitos, o animal demonstre, de alguma maneira, seu descontentamento. Assim, é comum encontrar cães ansiosos, nervosos, agressivos ou com comportamentos repetitivos, como o de lamber sem parar as patas ou determinada parte do corpo, causando até ferimentos.
Neste sentido, também esclarece Kardec, em O livro dos Espíritos, no capítulo 11, que trata dos Três Reinos, com a explicação dada pelos espíritos para a pergunta 593: "Não se poderia negar que, além de possuírem o instinto, alguns animais praticam atos combinados, que denunciam vontade de operar em determinado sentido e de acordo com as circunstâncias. Há, pois, neles, uma espécie de inteligência, mas cujo exercício quase se circunscreve à utilização dos meios de satisfazerem às suas necessidades físicas e de proverem à conservação própria." Ou seja, se eles se mutilam na ausência do dono, contrariando a lei de conservação, não é demais concluir que o fazem impulsionados por outro agente que não seja o instinto, embora esse seja predominante em sua constituição global.
A questão do instinto
De acordo com A Gênese de Allan Kardec, no capítulo sobre O bem e o mal o instinto é explicado da seguinte forma: "É a força oculta que solicita os seres orgânicos a atos espontâneos e involuntários, tendo em vista a conservação deles. Nos atos instintivos não há reflexão, nem combinação, nem premeditação". E complementa: "É pelo instinto que os animais são avisados do que lhes convém ou prejudica, que buscam, conforme a estação, os climas propícios; que constroem, sem ensino prévio, com mais ou menos arte, segundo as espécies, leitos macios e abrigos para as suas progênies, armadilhas para apanhar a presa; que manejam destramente as armas ofensivas e defensivas de que são providos; que os sexos se aproximam; que a mãe choca os filhos e que estes procuram o seio materno". Confirmando Kardec, Ronaldo Novoa diz: "Não só os cães, mas todos os seres vivos, têm reações de acordo com o meio. Uma planta irá sempre procurar a claridade, agindo de acordo com o meio para sua sobrevivência. Os animais domésticos têm suas condutas psicológicas, diferentes do ser humano. Assim, os animais sofrem, mas de um jeito diferente que imaginamos".
Comportamento e distúrbios psicológicos
"Hoje temos cães possessivos, outros inseguros ou os dominantes. Alguns com um tipo de desvio, levando à agressividade. Esses cães têm muita energia e precisam de atividades para se estabilizar!", diz o especialista em comportamento canino e adestrador paulista Ronaldo Novoa, que trabalha com educação de cães há 16 anos. Ele também treina animais para pet terapia, além de fazer parte de um corpo de profissionais da saúde (www.lianaequoterapia.com.br) que atuam nessa atividade terapêutica com pessoas portadoras de dificuldades motoras e psicológicas, com diversas síndromes e fobias. O especialista concorda com o companheiro de profissão mexicano quanto ao reflexo do comportamento do dono em seu cão: 'Muitos cães se tornam problemáticos por falta de conhecimento dos donos de como lidar com eles. Porém esses mesmos cães podem ser reabilitados em pouco tempo e ter uma vida mais tranquila se os humanos tiverem mais boa vontade para com eles. Meu trabalho é a reabilitação de cães e educar as pessoas para entendê-los melhor". Ronaldo explica que a convivência entre animal e homem precisa ser estimulada porque passa pelo instinto. Veja o que ele diz a respeito: "Para o cão, é essencial o convívio, por ser um animal que vive em matilha, ou bando, ele precisa de nossa presença. Cães precisam de 60% de atividade física, 30% de disciplina e 10%¨de afeto. Infelizmente, isso não é nem sombra da realidade na maioria dos lares". E o adestrador conclui que a falta de equilíbrio nessa relação, pela ausência prolongada do dono ou pela indiferença, pode, sim, levar a sérias crises, como as síndromes de ansiedade. "Eles desenvolvem sérias complicações físicas como feridas, mutilações ou mesmo machucados quando tentam passar por janelas e portas de vidro. Problemas psicológicos também são encontrados como ansiedade, tristeza e depressão".
(texto publicado na revista Alma animal nº 14 - ano 6 - ano de 2012)
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