sábado, 20 de dezembro de 2014

Amor x poder - Danuza Leão


Houve um tempo em que falar de dinheiro era feio, só que hoje não se fala de outra coisa. Nesse tempo, os homens se encarregavam de todas as despesas do casal - algo do passado - e, por isso, tomavam todas as decisões. Mas as coisas mudaram: agora eles ganham o seu, as mulheres o delas, e as despesas dos casais são divididas, do condomínio ao restaurante. E trabalhando e se dando bem, muitas faturam mais que o companheiro e se tornaram, assim, mais poderosas.

O que se quer é a harmonia universal, entre os países e entre os casais, mas quem tem mais poder, justa ou injustamente, é quem costuma mandar; se for ela a mais poderosa, ocorre o mesmo. Só que homens não gostam disso, pois tendem a confundir poder econômico com masculinidade. Se ela chega excitada mostrando o sapato novo de sola vermelha, caríssimo - mulheres, como se sabe, não resistem a sapatos e bolsas -, nenhum homem consegue entender; e, quando ele pensa que aquele sapatinho custou quase o que ele ganha em um mês de trabalho, o problema está criado.

Ela tem direito: afinal, o dinheiro é dela. Mas entre homem e mulher não tem essa de direitos - e, para que a vida siga suave, vai caber a ela não deixar, em nenhum momento, que ele se sinta inferiorizado por meras questões materiais. Algumas vão contornar com uma mentirinha suave, que, além do mais, não tira pedaço de ninguém. Não vai confessar, nem sob tortura, quanto custou aquela bolsa, que ela vai pagar em cinco vezes sem juros. Há, porém, uma maneira mais gentil de se comportar, e isso vale para o homem e para a mulher.

A parte do casal que ganha mais não pode deixar isso claro nem ser arrogante, nem muito prepotente; se for ele, deve ser extremamente gentil para que em nenhum momento ela se sinta dependente, por razões no fundo ridículas, como é o dinheiro. Não que não seja bom, dinheiro é ótimo. Mas a convivência do que tem menos com o que tem mais é no mínimo delicada. Se é a mulher que está mais confortável no quesito, cabe a ela ser generosa e não deixar que ele se sinta, jamais, em situação inferior por essa bobagem, que é ter mais ou menos grana.

Quando existe amor, tudo é fácil. Nunca force a barra para ir ao restaurante mais caro, por exemplo; é tão simples deixar que ele escolha aonde vão, de acordo com as possibilidades. E o convide para ir ao lugar mais luxuoso no dia do aniversário dele, tendo a gentileza de no final do jantar se levantar fingindo que vai ao toalete e pagar a conta sem que ele veja. Se forem viajar, melhor fazer as contas de quanto os dois vão poder gastar por dia e entregar a parte dele antes do embarque para que o próprio administre (e compre seus sapatos e suas bolsas quando ele estiver vendo um jogo na TV). No Natal, faça discretamente com que ele saiba que você está louca para ganhar um determinado presente - modesto, dentro do que ele pode comprar -, e quando ele chegar, mostre a mais deslavada alegria: como é que ele soube que aquilo era o que você mais queria na vida?

São pequenas bobagens, mas, afinal, é delas que a vida é feita; e ter um marido carinhoso, apaixonado e amoroso não é melhor do que viver numa eterna batalha discutindo quem tem mais poder?

Eu acho.




(texto publicado na revista Claudia - novembro de 2012)


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