segunda-feira, 23 de março de 2015

Uma bomba-relógio - Adriana Dias Lopes


A internação da modelo gaúcha Andressa Urach, ávida por aumentar as coxas, é um alerta para o perigo dos tratamentos estéticos sem critérios

Até a tarde da última sexta-feira, a modelo e apresentadora de televisão gaúcha Andressa Urach, de 27 anos, recuperava-se na Unidade de Terapia Intensiva do Hospital Conceição, em Porto Alegre, de uma grave infecção decorrente de intervenção estética realizada fazia cinco anos. A vice-campeã do concurso Miss Bumbum 2012 teve os rins paralisados e foi submetida a respiração por meio de aparelhos. Na quarta-feira, ela já se livrara do suporte artificial. Apesar da melhora, não havia previsão de alta. Andressa nunca escondeu a sua predileção por procedimentos estéticos - preenchimento nos lábios, implante de silicone (cerca de 500 mililitros em cada mama), mudanças na anatomia do nariz e do maxilar, além de injeções de toxina botulínica. "Sempre quis ser perfeita como a Barbie", dizia Andressa, que elenca entre seus feitos um par de noites com Cristiano Ronaldo. Em 2009, insatisfeita com o tamanho de suas coxas, submeteu-se ao implante de dois polímeros, compostos sintéticos semelhantes ao plástico. Foi o que quase a matou.

As substâncias usadas foram a poliamida e o metacril, misturadas a uma solução de água e soro fisiológico, conhecida como hidrogel. São compostos que o organismo é incapaz de absorver, atalho para uma infecção crônica, deflagrada quase sempre muito tempo depois de sua aplicação. O polímero facilita a aderência de bactérias. Os micro organismos juntam-se ao material sintético e criam ao redor dele uma camada de proteínas e lipídios. "Dessa forma, o germe fica protegido tanto da ação do sistema de defesa do organismo como de antibióticos", diz o cirurgião plástico Marcelo Sampaio, do Hospital Sírio-Libanês, em São Paulo. Com o tempo, as bactérias proliferam de tal forma que o escudo se torna ineficiente. Elas, então, caem na corrente sanguínea. O hidrogel é apenas um veículo para a aplicação dos polímeros e, eliminado pelo organismo, não oferece perigo. A princípio, os polímeros seriam indicados para o preenchimento de rugas, em quantidades mínimas. Cada coxa de Andressa carregava pelo menos 500 mililitros do produto.

Desde julho passado, quando começou a sentir os primeiros sintomas de infecção (dores, enjoo e febre alta), Andressa foi submetida a quatro cirurgias para extrair os compostos do organismo. Problema: os polímeros são microscópicos e se espalham por entre as células de gordura, vasos sanguíneos e músculos. É, portanto, impossível removê-lo por completo, e o resultado é uma bomba-relógio. A poliamida usada pela modelo, produzida na Ucrânia, está com o registro vencido no Brasil desde dezembro de 2013. Mesmo assim, centenas de mulheres submetem-se a procedimentos de preenchimento com o composto - em clínicas e hospitais.



(texto publicado na revista Veja edição 2043 - ano 47 - nº 50 - 10 de dezembro de 2014)

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