domingo, 25 de setembro de 2016

Cuidado, é antibiótico! - Bárbara Louise


O remédio trata infecções por bactérias e ajuda o sistema imunológico a vencer a batalha contra esses micro-organismos. Apesar disso, o uso abusivo pode afetar a saúde de toda a comunidade. Veja o que é preciso saber antese da primeira dose

A cena é clássica. Você vai ao médico com alguma infecção, seja ela de garganta, urinária, seja de ouvido, e o tratamento mais comumente indicado é o uso de antibióticos. Segundo dados da Organização Mundial da Saúde (OMS), as infecções causam 25% das mortes em todo o mundo e, nos países menos desenvolvidos, esse número sobe para 45%. No entanto, de acordo com o órgão, o uso de antibióticos, mesmo formalmente prescritos, pode ser desnecessário em até 50% dos casos. O Brasil atualmente é o quarto mercado de consumo de medicamentos no mundo e os antibióticos são responsáveis por 40% do total de vendas, de acordo com o Sindicato das Indústrias Farmacêuticas (Sindusfarma).

De maneira inocente, os pacientes acabam pedindo aos médicos que prescrevam antibióticos, mas a ingestão indiscriminada cria bactérias multirresistentes. Por isso, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) passou a regular a venda desse tipo de remédio, a partir de outubro de 2010, com o objetivo de reduzir a exposição da população aos antibióticos e, com isso, combater a resistência bacteriana a esse grupo de medicamentos, situação na qual eles passam a não ter mais eficácia pela utilização incorreta.

Só com receita

Desde então, os antibióticos só podem ser vendidos mediante a apresentação da receita de controle especial em duas vias. A primeira via fica retida na farmácia e a segunda deve ser devolvida ao paciente carimbada para comprovar o atendimento. Além disso, as embalagens e bulas devem ter a frase "Venda sob prescrição médica - só pode ser vendido com retenção da receita". "Há fármacos de administração oral, intravenosa, intramuscular e tópica. Ainda há diversos antibióticos usados em larga escala nos mais diversos setores da indústria e da agricultura, o que nos expõe a eles, podendo até mesmo contribuir com a resistência dos microorganismos", afirma a infectologista Bianca Grassi de Miranda, do Hospital Samaritano (SP).

Para ajudá-lo a proteger a si e sua família, a VivaSaúde pediu que dois especialistas, os infectologistas Alexandre Naime Barbosa, professor da Faculdade de Medicina da Universidade Estadual Paulista (Unesp-Botucatu) e Bianca Grassi de Miranda explicassem o que é necessário perguntar ao médico antes de sair do consultório com a receita na mão. Confira.

Tenho que tomar esse medicamento?

Os antibióticos só devem ser indicados em caso de diagnóstico de infecções bacterianas ou em algumas situações, como prevenção para essas infecções. A escolha entre os diferentes tipos de antibióticos recai sobre a análise da evidência científica sobre o tema, ou seja, a depender da doença, qual fármaco trouxe maior taxa de sucesso terapêutico no grupo de pacientes estudados.

Há marcas em doses exatas?

Várias apresentações de antibióticos têm a quantidade exata de comprimidos para determinada infecção, o que ocorre é que as caixas são produzidas com o número de comprimidos para as infecções mais prevalentes, e muitas vezes a doença do paciente exige um pouco menos ou um pouco mais de comprimidos.

Posso tomar minha cerveja ou vinho?

O uso do álcool de forma moderada não causa nenhum tipo de alteração na eficácia, na metabolização, na concentração ou na eliminação dos antibióticos. A exceção se faz à classe dos imidazólicos (exemplo: metronidazol), pois o uso concomitante pode levar a sintomas como calor, vômito e taquicardia. Em caso de uso abusivo do álcool, o desfecho pode ser a redução da defesa do corpo, o que é especialmente grave em casos de infecção.

O que faço se esquecer ou atrasar a medicação?

Atrasos de até metade do tempo até a próxima dose permitem realizar a tomada assim que se perceber o esquecimento, mantendo-se o próximo horário predeterminado. Caso já tenha passado mais da metade do tempo, o ideal então é fazer a tomada imediatamente, e reagendar as próximas doses de acordo com a posologia. Por exemplo: se uma medicação deve ser tomada às 6h e às 18h, mas o indivíduo toma às 8h, deve tomar a próxima dose às 20h. Esta é uma regra geral, e pode não se aplicar a todos os casos.

Tomo outros medicamentos. Isso pode interferir?

Os profissionais da saúde devem se valer de ferramentas que permitam checar rapidamente uma a uma as milhares de possíveis interações entre medicamentos, e elas são frequentemente atualizadas. Ao receber a indicação de um antibiótico, peça a seu médico que cheque as possíveis interações medicamentosas com os remédios que usa, e não introduza nenhum novo fármaco sem antes noticiar o profissional que você consulta regularmente.

Minhas defesas vão baixar pelo uso?

O organismo tem bactérias que têm papel na defesa contra infecções. Ao usar os antibióticos, pode haver comprometimento dessas bactérias que são consideradas "aliadas" do organismo, por exemplo, a destruição da flora intestinal, levando a sintomas como diarreia. Mas quando é bem indicado e fazendo o seguimento clínico, esse risco é potencialmente nulo. Mas, atenção, ele em nada interfere no sistema imunológico, na verdade ele ajuda a combater as infecções.

Os vários tipos e indicações de uso

O primeiro antibiótico a ser utilizado com sucesso foi a penicilina, descoberta por Alexander Fleming em 1928. Com o passar do tempo, novas classes foram desenvolvidas, caracterizando-se por ações específicas a depender do tipo de bactéria, do local e da gravidade da infecção. De acordo com o infectologista Barbosa, os antibióticos se dividem em dois grandes grupos: bactericidas (destroem diretamente as bactérias) e bacteriostáticos (bloqueiam o ciclo de replicação das bactérias, mas sem matá-las). "A principal diferença entre eles é que, em cada situação clínica, alguns se encaixam como de melhor opção, pois levam ao maior sucesso terapêutico", explica Barbosa. E que fique claro:antibióticos não tratam doenças causadas por vírus como resfriados comuns, gripes, bronquites agudas, coriza e sinusites.

E se eu parar o tratamento?

Se o paciente interromper precocemente a terapia, provavelmente não terá resultado, podendo levar a graves consequências, a depender da razão de indicação do antibiótico. Há risco de que o tratamento não seja eficaz e a infecção não seja curada, trazendo possíveis complicações ao paciente.

Quanto vou esperar para melhorar?

Em geral a melhora clínica acontece após 48 horas de uso dos antibióticos, mas esse intervalo de tempo varia muito a depender da doença diagnosticada, da gravidade do quadro, do antibiótico escolhido e das características do paciente. No entanto, se houver piora a qualquer momento, o médico deve ser procurado.

E quando o paciente é uma criança

Não há limite para o número de prescrições anuais de antibióticos para crianças ou adultos. Se bem indicado, o antibiótico deve ser utilizado quantas vezes forem necessárias. Se os pais ou o paciente suspeitarem de excessos, devem procurar um pediatra ou um infectologista para avaliação global do caso. Há antibióticos que podem ser usados para os dois grupos de pessoas, mas há determinados tipos que são indicados especificamente a um. Este é mais um motivo pelo qual o fármaco deve sempre ser prescrito por um médico.

Tomo anticoncepcional. Ele pode anular o efeito da pílula?

Somente um antibiótico (rifampicina, usado principalmente no tratamento da tuberculose) tem comprovada ação que compromete a eficácia dos anticoncepcionais. É importante que a paciente informe ao médico o uso de anticoncepcionais, para que ele possa checar possíveis interações medicamentosas.

Antibiótico errado agrava uma infecção?

Sim, em alguns casos indicação ou uso inadequados dos antibióticos podem complicar gravemente uma infecção. Entre os vários exemplos, se destaca o uso de antibióticos que não ultrapassam a barreira hematoencefálica em casos de meningite bacteriana.

A garganta dói, posso tomar?

Existem algumas situações específicas que exigem o uso preventivo de antibióticos, como em certas situações cirúrgicas ou odontológicas, ou ainda em exposição potencial à doenças infecciosas, como a leptospirose. Não se justifica usar antibióticos para prevenir infecções ao sentir dor de garganta. Na maioria das vezes, esse sintoma se refere a um resfriado, que é uma infecção viral. É importante lembrar que a indicação preventiva de antibióticos deve sempre ser feita por um médico.

Por quanto tempo devo tomar o remédio?

Depende da doença, da gravidade do quadro, do antibiótico escolhido e das características do paciente, podendo ser tão curto como somente um dose única (exemplo: alguns DSTs) ou até mesmo de seis meses a um ano (exemplo: tuberculose).




(texto publicado na revista VivaSaúde edição 156)

Nenhum comentário:

Postar um comentário