quarta-feira, 28 de setembro de 2016

Pet love - amor de bicho: Dura na queda - Gislaine Bittencourt


Era 1995. Fui com minha mãe à casa de um marceneiro para ver o preço dos berços, pois minha amiga estava grávida do primeiro filho. Enquanto mamãe conversava com ele, vi um menino jogando o que parecia ser um bicho de pelúcia na parede. Ora jogava, ora chutava.

Chegando mais perto, constatei que não era um brinquedo e sim um gatinho, minúsculo, com lindos olhos azuis. Minha vontade era pegar aquele animalzinho e sair correndo.

A dona da casa, vendo que eu não tirava os olhos do bichinho, disse que era uma gatinha siamesa e perguntou se eu não queria levá-la. Olhei para minha mãe que, com certeza, viu em meus olhos o desejo de ficar com a gata.

Olhamos juntas para um canto da casa: no chão, encostada à parede, a gatinha comia grãos de feijão seco.

Naquele momento minha mãe tomou a decisão que mudaria a vida daquela gatinha para sempre. Pegamos o animalzinho, o embrulhamos em uma sacola plástica e o trouxemos para casa. Ao chegarmos, nossa primeira missão foi dar na gata um banho bem quentinho. Tiramos mais de cem pulgas daquele corpinho miúdo. Ela era tão magrinha que podíamos contar suas costelas.

A gata foi batizada de Isabel Bittencourt, nossa querida Bel. O nome foi homenagem a uma jogadora de futebol do time de coração do meu irmão.

Durante dias, a Bel só se levantava da caminha par comer; não tinha forças para mais nada. No décimo dia, enquanto eu estendia as roupas no varal, minha mãe, surpresa, viu a Bel brincando na grama, aos seus pés. A partir deste dia, Bel passou a acompanhar minha mãe aonde ela ia - adotou-a como sua verdadeira mãe. Quando a mostrávamos às pessoas, enroladinha em suas cobertas, só com a carinha de fora, todos a achavam linda. Mas, quando tirávamos o cobertor, o pavor era geral. Bel era toda deformada por causa das surras que levou antes de nós a adotarmos.

Seu brinquedo preferido era jogar as bolinhas de lã que minha mãe fazia. Também gostava muito de caçar: formigas, borboletas, mosquitos, moscas, ratos e passarinhos.

Como não sabíamos ao certo sua idade, quando percebemos, Bel estava no cio. E já que é uma gata siamesa, a prendemos na dispensa com um gato da mesma raça. Mas a dana não quis saber do "nobre" partido. Toda vez que ele tentava uma aproximação, apanhava.

Depois de um tempo, percebemos que ela estava prenha. Um dia, conversando com o vizinho, minha mãe soube que a Bel tinha pego cria de um gato vira-lata, preto e branco, que morava na casa em frente.

No dia 23 de dezembro de 1995, pela manhã, Bel entrou em trabalho de parto. À tarde, como ainda não havia nascido nenhum filhote, a levamos a uma clínica veterinária. Lá, a Dra. Rosane nos disse que seria necessário fazer uma cesariana. Minha mãe, antecipando que toda vez que Bel pegasse cria iria sofrer, autorizou a castração.

Meus pais me deixaram na clínica e foram resolver umas pendências. Passado algum tempo, o Dr. Marcelo me chamou e pediu que eu o ajudasse com os filhotes. Bel tinha dado à luz cinco lindos machinhos: três malhados de preto e branco e dois totalmente pretos.

Bel foi uma uma mãe muito zelosa. Sempre que recebíamos alguma visita lá ia ela, carregando um por um os filhotes para o quarto dos meus pais. Em janeiro, uma amiga do trabalho esteve lá em casa e acabou levando dois filhotes - um preto para ela e um malhado para sua sogra. Ficamos com os outros três, que  foram batizados de: Thomás Hélio, que era meu; Tobias Izidoro, do meu pai; e Tião, da minha irmã.

Em fevereiro viajamos de férias para a praia e, lá, Bel se transformou numa verdadeira leoa, defendendo sua cria. Em certa ocasião, jogávamos cartas quando vimos que Bel entrava, abaixadinha, carregando um dos filhotes. Ficamos observando: ela trouxe os três e colocou-os na caixa que servia de cama para eles. Em seguida, saiu novamente para a rua. Curiosos, fomos atrás a fim de verificar o que acontecia. Bel estava "pondo para correr" uma cadela que deveria ter mais ou menos dez vezes o seu tamanho!

Apesar de todo amor, carinho e boa alimentação, o passado de maus tratos deixou a saúde de Bel muito frágil. Em julho, ela sofreu um grave acidente. Minha mãe a encontrou sangrando pelos olhos e ouvidos. Desesperada, ligou para meu pai, que levou as duas direto para a clínica. Após examiná-la, a veterinária disse que Bel tinha levado uma paulada ou pedrada na cabeça. Foi um susto terrível, ficamos apavorados com medo de perdê-la. E nunca descobrimos quem a maltratou...

Em outra ocasião, Bel tomou mais de dez injeções por causa de uma infecção respiratória. Meses depois, teve uma infecção no ouvido e precisou ser operada sem anestesia por causa da idade avançada. Ela ainda sofreu durante mais de um mês fazendo exames de sangue e fezes até descobrirmos, após uma ecografia, que Bel estava com uma grande infecção na alça do intestino.

Hoje, apesar de já ter 14 anos, ela ainda corre pela casa, como se estivesse brincando de pega-pega. Espera, na porta do quarto, minha irmã se levantar para ir dormir na cama dela.

À tarde, na hora da sesta, dorme com minha mãe. À noite, deita no sofá, entre meus pais, para ver TV. Outra mania que a Bel tem é abrir a porta do armário da cozinha. Abre apenas pelo prazer do ato, pois não entra lá.

Apesar de todos os problemas que enfrentou, tenho certeza que Bel é feliz. E nós somos mais felizes ainda, por desfrutarmos de sua companhia!



(texto publicado na revista Seleções de abril de 2009)

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