quarta-feira, 7 de setembro de 2016

Açúcar: amigo ou inimigo da saúde? - Dr. Daniel Magnoni


O cardiologista e chefe de nutrição do Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia, Daniel Magnoni, responde a essa e outras dúvidas sobre o doce ingrediente

Essencial para o corpo, pois é fonte de energia e contém substâncias que estimulam o cérebro a produzir serotonina  - neurotransmissor responsável pela sensação de bem-estar e prazer -, o açúcar quase sempre é considerado o grande vilão da saúde. Mas o Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia quer desmistificar essa questão.

Para isso, e também com o objetivo de compreender os hábitos e os comportamentos de quem consome o ingrediente e obter subsídios para ajudar na educação nutricional da população, a entidade realizou, entre setembro e dezembro de 2015, a pesquisa "Consumo equilibrado: uma nova percepção sobre o açúcar". No período foram realizadas 1.199 entrevistas com homens e mulheres de 18 a 85 anos - pacientes do ambulatório do hospital e pertencentes às classes A, B e C.

Os resultados mostraram que 71% das pessoas ingerem o alimento, sendo 46,5% homens e 53,5% mulheres. Desses, 85% afirmaram que optam pelo branco e o utilizam, em grande parte, para adoçar café ou chá (88%) e em sobremesas e bolos (82%). O maior consumo foi observado na faixa etária de 18 anos a 35 anos, porém, ele cai de acordo com o aumento da idade.

O estudo também apontou outros dados interessantes: apenas 36% dos participantes costumam ler o rótulo dos alimentos - deles, 54% buscam informação sobre o açúcar - e 73% da população que consome açúcar e pratica atividade física está com peso adequado. Saiba mais a seguir na entrevista com o cardiologista e chefe de nutrição do Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia, Daniel Magnoni.

Qual a quantidade ideal de açúcar a ser consumida por dia?

Todos podem consumir até 20% das calorias diárias com alimentos que contêm açúcar adicional como bolachas, sucos e cafés, mas isso tira da conta frutas, verduras e outros alimentos naturais que contenham sacarose. Essa porcentagem equivale a 50g do ingrediente ou 10 colheres de chá.

E essa quantidade varia de acordo com a faixa etária?

A quantidade varia mais dependendo do estilo de vida que a pessoa leva do que com a idade que tem. Por exemplo, atletas podem consumir até um pouco mais do que essa recomendação, pois gastam mais energia, já as pessoas sedentárias devem fazer um consumo mais equilibrado, pois não gastam tantas calorias. Há, ainda, uma recomendação mais específica para o público infantil.

E qual seria?

Crianças de dois a cinco anos podem consumir açúcares até 10% do valor energético total. Isso significa 35 gramas por dia, considerando uma dieta de 1500 Kcal. Na prática, pode ser uma colher de sopa cheia (30 g) diária, somando todos os açúcares do dia ingeridos. Crianças entre seis e dez anos têm necessidade energética de 1800 Kcal. Nesse caso, a quantidade recomendada de açúcares diária aumenta para, em média, 45 gramas, o que corresponde a uma e meia colher de sopa cheia.

A pesquisa "Consumo equilibrado: uma nova percepção sobre o açúcar" mostra que o açúcar branco é o mais consumido pelos brasileiros. Por quê?

Esse tipo de açúcar, além de ser o mais barato, é o mais presente nos mercados. Esta variação é, também, a melhor escolha para a culinária, pois não tem sabor residual como os menos refinados.

Tem algum açúcar mais indicado para consumo e com menos consequências ruins?

Nenhum açúcar tem consequências negativas se consumido com equilíbrio. Assim, o mais indicado é o que o consumidor ache o melhor para ele, pois apesar do sabor característico, os tipos pouco diferem em termos nutricionais, sendo que os mais refinados têm menos micronutrientes (vitaminas e minerais).

Quais são os tipos de açúcar disponíveis e as principais características de cada um?

Todos os açúcares têm os mesmos benefícios: trazem sensação de prazer e energia para o corpo. Os malefícios independem do tipo e só ocorrem se consumirmos em grande quantidade. A escolha de como adoçar é muito pessoal e o que muda realmente em cada tipo é o gosto.

Dizem que o açúcar é inimigo da saúde. Isso procede?

O açúcar é um carboidrato presente nas frutas e nos vegetais e não deve ser considerado inimigo. O prazer que sentimos com alimentos de sabor adocicado é inato, e a preferência por doces ajudou nossos ancestrais a distinguirem os alimentos seguros e que dariam mais energia dos potencialmente tóxicos ou inadequados para consumo. Ele é um ingrediente como qualquer outro. O exagero, sim, pode ter consequências e deve ser evitado. Ainda é importante reforçar que o que falta, muitas vezes, é saber conciliar vontade com bom senso. Nenhum elemento sozinho causa doenças. A maioria das relacionadas ao açúcar, como a obesidade e o diabetes, tem a ver com o excesso de calorias consumidas sem o devido gasto.

Então, não é indicado cortar o açúcar da dieta?

Existe um espaço na pirâmide alimentar para o consumo de açúcar, ele é pequeno se comparado aos outros grupos alimentares, porém não deve ser ignorado. Além disso, o açúcar é essencial para o corpo, pois é fonte de energia e contém substâncias que estimulam o cérebro a produzir serotonina, neurotransmissor responsável pela sensação de bem-estar e prazer. Fora isso, a glicose, molécula proveniente da quebra de açúcares, é a única fonte de energia utilizada pelo cérebro, importante para quem estuda ou trabalha. O ingrediente é relacionado, ainda, a diversas memórias afetivas e sua presença se dá em contextos sociais positivos, como confraternizações e encontros com familiares e amigos. Repito: ninguém deve evitá-lo, mas sim consumir em quantidades apropriadas.

Muita gente substitui o açúcar pelo adoçante. Isso é bom?

Como nenhum alimento isoladamente faz mal à saúde, isso vale também para os adoçantes. No mais, por ser extremamente doce, consumi-los faz com que não nos habituemos ao sabor natural dos alimentos e a ideia de que não tem calorias faz as pessoas consumirem mais. Mas o uso do adoçante ou açúcar é uma opção pessoal. Caso o adoçante seja escolhido, é importante ressaltar que os com base aspartame não são recomendados em receitas que vão ao formo, fogão ou microondas, e eles ainda podem mudar o sabor e o aspecto as receitas culinárias. O indicado para preparações quentes são os formulados para "forno e fogão".

Como construir um estilo de vida equilibrado sem eliminar o açúcar por completo?

Retirar o açúcar da alimentação não é necessário e nem mais saudável. Corre-se o risco de, quanto mais cortar, mais aumentar a vontade de comer, principalmente pela sensação de "proibido". Além disso, apenas a redução no consumo de açúcar ou outros alimentos, não resolve nenhum problema. A alimentação deve ser equilibrada em todos os sentidos, com a escolha de produtos naturais, a redução na quantidade da porção e o aumento da qualidade dos alimentos. Os benefícios de uma vida saudável estão na redução da ingestão calórica, associada ao aumento de atividade física, e redução de estresse, entre outros fatores.

A pesquisa mostra que as mulheres são as que mais consomem doces. Por que isso acontece?

A oscilação hormonal durante a TPM (Tensão Pré-Menstrual) é um fator determinante para a maior procura pelo doce. Junto com isso, há uma queda no nível de serotonina, e sua baixa explica sintomas como irritabilidade, variação de humor e aumento na fome, especialmente fome de doces, em uma tentativa do organismo de conseguir mais carboidratos, que aumentem a síntese de serotonina. Por isso, mesmo quem não costuma comer doces, na TPM se volta para o açúcar como uma fonte de bem-estar. As mulheres são também as que se sentem mais culpadas após ingerirem açúcar. Porém, esse consumo não é prejudicial à saúde, mesmo em casos de dieta. O segredo está no equilíbrio. É melhor comer um doce quando se tem vontade, do que tentar enganar o organismo com outras opções. Assim, o consumo se torna mais inteligente e evita algo bem comum: as mulheres comerem "o mundo" tentando driblar a vontade do doce e  depois não resistir e comer o doce por cima.

Para uma pessoa que exagera nos doces, qual a recomendação para que ela consiga diminuir?

Diminuir, aos poucos, o açúcar adicionado aos alimentos. Por exemplo, experimentar reduzir o usado na receita do bolo e colocar menos no café. Quem usa uma colher, pode colocar 3/4. Também deve-se utilizar a quantidade adequada de acordo com o tamanho da porção. E tem mais: pedir açúcar a parte, para controlar melhor; peneirar cereais matinais antes de consumir; evitar adoçar por puro hábito, e conhecer a quantidade de açúcar dos alimentos.

Confira os tipos de açúcar

- Cristal: apresenta como cristais maiores e transparentes, sendo mais difícil dissolvê-lo. No seu processo de fabricação, a etapa de cristalização elimina a maioria das impurezas, ou seja, tudo oque não é sacarose;

- Refinado: é o mais comumente encontrado nos supermercados. No processo de refino são adicionados novos produtos químicos para torná-lo mais branco. Ele tem cristais bem pequenos e maior facilidade de dissolução;

- De confeiteiro: é mais utilizado para decorar receitas como bolos, biscoitos e tortas. Seus cristais são extremamente finos e com a aparência de pó. Antes de serem embalados recebem a adição de uma pequena quantidade de amido para evitar que os cristais fiquem grudados;

- Orgânico: em geral, apresenta-se na forma de cristais maiores e mais escuros. Na sua produção não são utilizados agrotóxicos ou insumos não autorizados. Tem preço mais elevado;

- Light: é a combinação do açúcar refinado com adoçantes artificiais. Deve ser evitado por pessoas que não podem ou não querem utilizar adoçantes. Por conta da presença dos edulcorantes, não tem o mesmo efeito culinário;

- Mascavo: tem coloração mais escura, parecida com o caramelo, e seu sabor lembra o da rapadura. É obtido diretamente da concentração do caldo de cana recém-extraído e não utiliza aditivos químicos. Apesar de preservar alguns micronutrientes, como fósforo, cálcio, magnésio e potássio, não pode ser considerado como fonte desses nutrientes, e

- Demerara: tem grãos na cor marrom claro e o processo de produção é muito similar ao do açúcar mascavo, porém, passa também por um processo de tratamento leve, utilizando menor quantidade de aditivos químicos.




(texto publicado na revista Divino Fogão nº 20 - ano 05 - ago/out de 2016)

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